quarta-feira, 9 de março de 2016

Super-Heróis DC 5 - Arqueiro Verde: Ano Um


Como o texto editorial deste volume é da minha autoria, aqui vos deixo com ele. limitando-se a presença do texto do Público à imagem abaixo.


O NASCIMENTO DE UM HERÓI

Todos os super-heróis têm uma génese, um momento definidor que os leva a abandonar uma vida normal e dedicar a sua existência a ajudar os outros e a combater o crime. Os leitores sabem bem que Bruce Wayne se tornou o Batman para impedir que mais inocentes morressem à mão dos criminosos, como aconteceu com os seus pais, tal como sabem que o jovem kryptoniano Kal El decidiu vestir o fato do Super-Homem, para ajudar o planeta que o acolheu e onde se fez homem. Embora contada de diferentes maneiras ao longo dos tempos, essa origem, na sua base, é geralmente imutável, mesmo que permita algumas interessantes variações. Basta pensar na última história de Batman Noir, de Brian Azzarello e Eduardo Risso, em que é Bruce Wayne quem morre e o seu pai quem se transforma no Batman, ou em Super-Homem: Herança Vermelha, de Mark Millar e Dave Johnson em que a nave que transporta Kal El aterra na Sibéria em vez de no Kansas, alterando profundamente o equilíbrio mundial.
No caso do herói que protagoniza este volume, o Arqueiro Verde, essa origem apresentou diferenças significativas ao longo dos tempos, até ser codificada de forma brilhante por Andy Diggle e Jock em Arqueiro Verde: Ano Um, a história que podem ler a seguir, publicada originalmente em seis edições quinzenais, entre Setembro e Novembro de 2007.
Aquando da sua primeira aparição em Novembro de 1941, nas páginas da revista More Fun Comics # 73, numa história escrita por Mort Weisinger e ilustrada por George Papp, o Arqueiro Verde surge já em acção ao lado do seu jovem ajudante Speedy, dotado de um arsenal de flechas especiais e de veículos como o Carro-Flecha, ou o Avião-Flecha, armazenados na Caverna-Flecha, o que, para além das óbvias semelhanças com o Batman, deixa perceber que a actividade secreta do milionário Oliver Queen e do seu pupilo Roy Harper, como combatentes do crime, não tinha começado naquele momento. Mas os leitores teriam de esperar quase dois anos, até à publicação da história The Birth of the Battling Bowmen, na revista More Fun Comics # 89, em 1943, para finalmente descobrirem a origem do Arqueiro Verde.
Nesta primeira versão, Oliver Queen é um arqueólogo, especializado na culturas primitivas americanas que, depois do Museu de que era Curador ser incendiado por criminosos, parte para uma expedição à Mesa Perdida, um planalto no meio do deserto onde encontra o jovem Roy Harper e o seu criado Quaog, únicos sobreviventes do desastre de avião que vitimou os pais de Roy, De origem índia, Quaog vai ensinar Roy a usar o arco e as flechas, o que lhes permite sobreviver naquele local inóspito, caçando pequenos animais e aves, mas os seus talentos como arqueiro não o impedirão de ser morto por um bando de criminosos que tinham seguido Oliver para roubar os tesouros indígenas escondidos na Mesa Perdida. Para além de derrotarem os bandidos, apenas com recurso a arcos e flechas, Oliver e Roy vão também encontrar um tesouro que os vai tornar ricos a ponto de se poderem dedicar a tempo inteiro ao combate do crime, sem quaisquer preocupações materiais.  
Em meados da década de 50, muitos das heróis da DC, cuja publicação tinha sido interrompida, regressam em novas versões, com novas identidades e novas origens, como acontece com o Flash, Átomo, ou o Lanterna Verde, dando assim início à Silver Age. O Arqueiro Verde é precisamente um dos heróis que regressa nessa altura, mantendo a sua identidade original, mas ganhando uma nova origem, pelas mãos do grande Jack Kirby. Assim, na história The Green Arrow First Case, publicada em 1958, na Adventure Comics # 250, Oliver Queen conta a Roy Harper como, depois de cair acidentalmente do seu iate em alto-mar, vai parar a uma ilha deserta no meio do Pacífico, tendo de fazer um arco improvisado, de modo a poder caçar e assim sobreviver. Os largos meses passados na ilha permitem-lhe tornar-se num arqueiro infalível e num caçador implacável. Capacidades que, uma vez regressado à civilização e à sua Star City natal, vai aplicar ao combate do crime.  
É essa nova origem, estabelecida por Jack Kirby, que vai servir de base a este Arqueiro Verde: Ano Um. Mas, como refere o próprio Andy Diggle: “As origens dos heróis não deviam permanecer imutáveis ao longo das décadas. Foram escritas para as crianças da década de trinta ou quarenta do século XX, não para adultos do século XXI. Se não reformulássemos e adaptássemos essas origens, o Batman ainda usaria uma arma e o Super-Homem não conseguiria voar! (…) a razão porque eu gosto dessas histórias de origens é porque te permitem mostrar a transformação das personagens e essa mudança é que as torna interessantes. O leitor vê Oliver Queen passar de um idiota bêbado para um herói capaz de se sacrificar pelos outros. Esta história é sobre a evolução da personagem, a sua transformação.”
Por isso, Diggle usa elementos da história de Kirby e de revisitações posteriores da origem da personagem, como a de Mike Grell, em Green Arrow: The Wonder Years, onde a referência ao lendário arqueiro Howard Hill, que trabalhou com Errol Flynn, surge pela primeira vez, para criar uma história original e marcante. Para esta história, Diggle vai recorrer ao seu velho amigo Jock, com quem já tinha colaborado em Lenny Zero - uma série derivada do Juiz Dredd, no início da sua carreira, quando os dois trabalhavam para a revista britânica 2000 AD, de que Diggle foi editor e argumentista - e na série Losers, da Vertigo, adaptada posteriormente ao cinema, num filme de grande orçamento, com um elenco de luxo, que incluia Chris Evans, Idris Elba e Zoe Saldaña.
Nascido em 1972 na Escócia, com o nome Mark Simpson, Jock é um artista versátil e talentoso, com uma carreira dividida entre a Banda Desenhada e a ilustração, seja desenhando histórias ou ilustrando capas para a DC e para outras editoras, seja trabalhando na concepção visual de filmes como Dredd ou Ex Machina. Com um estilo extremamente gráfico, em que o desenho manual se articula harmoniosamente com a cor digital, Jock possui um notável sentido de composição, que lhe permite criar páginas icónicas, capazes de funcionar isoladamente, como se de posters se tratassem, mas que em nada atrapalham o fluir da narrativa.
O seminal Batman: Ano Um, de Frank Miller e David Mazzuchelli (já publicado numa colecção da Levoir) colocou a fasquia muito alta no que se refere às histórias de origem dos super-heróis, mas este livro mostra estar à altura de tão pesada herança. Em Arqueiro Verde: Ano Um, Jock e Diggle criam uma história icónica e muitíssimo bem contada, cuja influência é visível, por exemplo, na série televisiva Arrow, que vai aproveitar a personagem de China White, introduzida por Diggle e Jock no universo DC. Uma influência que os escritores da série são os primeiros a reconhecer, ao darem a John Diggle, um dos parceiros de Oliver Queen na luta contra o crime, o mesmo apelido do escritor deste Arqueiro Verde: Ano Um.

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