segunda-feira, 29 de junho de 2015

Ted Benoit


Terminou o Festival de Beja sem que eu chegasse a fazer o prometido post com um punhado de imagens do mais agrádavel Festival de BD em Portugal. em vez disso, deixo-vos com o texto que escrevi para o catálogo do Festival, sobre Ted Benoit. 
Infelizmente, por razões de saúde, Benoit teve que cancelar à ultima da hora a sua presença em Beja, tal como aconteceu também com Yslaire (neste caso, sem qualquer justificação...). Mas a verdade é que a ausência de dois nomes com este peso, mal se fez notar, pois os seus originais estavam lá e a edição foi uma das mais animadas de sempre, confirmando que o excelente trabalho de Paulo Monteiro e da sua equipa resiste bem a este "pequenos" contratempos.

TED BENOIT, DA LINHA CLARA À CAMERA OBSCURA

Um dos melhores seguidores da Linha Clara, termo criado por Joost Swarte para definir o estilo de Hergé e de outros autores da escola de Bruxelas, Ted Benoit, é mais conhecido por ter sido o responsável gráfico pelo regresso de Blake e Mortimer, após a morte de Jacobs, ilustrando O Caso Francis Blake e O Estranho Encontro, dois livros escritos por Jean Van Hamme. Mas, naturalmente, a carreira de Ted Benoit, autor que regressa a Portugal, depois de uma passagem em 1997, pelo Festival da Amadora, não se resume à sua ligação à série Blake e Mortimer.
O autor francês, nascido em 1947, estreou-se na Banda Desenhada em meados da década de 70, nas páginas da revista Metal Hurlant, depois de ter tirado o curso de altos estudos cinematográficos e trabalhado em televisão. Depois da Metal Hurlant, seguiu-se a revista Echo des Savanes. E se as primeiras histórias que aí publicou mostram um autor em busca de um estilo próprio, sendo visíveis a influência de Moebius em Carnets de Voyage (1976) e de Tardi em Hôpital (1977), já no seu trabalho seguinte, Aux Premieres Loges, escrito por Jacques Lob, é bem visível a influência da Linha Clara e do trabalho de Hergé e de Joost Swarte, algo que Benoit assume claramente, dizendo: "o desenho de Hergé estava tão ancorado no nosso inconsciente colectivo que se tornou uma ferramenta. Era como desenhar com um lápis, ou um pincel."
Essa reinvenção da linha clara, misturada com a estética do cinema americano dos anos 50, já evidente nas histórias de Bingo Bongo, publicadas na Metal Hurlant, concretiza-se perfeitamente nas aventuras de Ray Banana, o seu personagem fetiche, que faz a estreia na revista (A Suivre) com Berceuse Electrique e que regressa em Cité Lumiere, uma aventura de Ray Banana, passada em Paris, no ambiente da arte contemporânea, cuja cor é da responsabilidade dos Estúdios Hergé.
Em Portugal, para além dos álbuns da série Blake e Mortimer que ilustrou, foram também editados Cidade Luz e O Homem de Nenhures, uma história escrita por Pierre Nedjar e protagonizada por Thelma Ritter, a empregada de Ray Banana.
Desde a publicação de O Estranho Encontro, em 2001, Benoit trocou a BD pela publicidade e pela ilustração, actividades bem mais rentáveis para um ilustrador. Até que, em 2013, dá-se o regresso à BD com a edição de Camera Obscura, uma recolha dos seus trabalhos iniciais, publicados originalmente nos anos 70 e 80 e com La Philosophie dans la Piscine, livro que assinala o regresso de Ray Banana, numa série de histórias curtas pré-publicadas no Blog do autor, em que a Linha Clara dá lugar a um traço mais solto e espontâneo, resultante da troca do pincel por simples esferográficas Bic.
Texto publicado originalmente no Splaft!nº 11, revista/catálogo do Festival de Beja, em Maio de 2015

terça-feira, 23 de junho de 2015

Ciclo de cinema Miyazaki e os Estúdios Ghibli, em Tomar


Tal como aconteceu o ano passado, com um ciclo sobre Banda Desenhada francesa no cinema, este ano voltei a colaborar com o Cineclube de Tomar, organizando uma pequena mostra dedicada a Hayao Miyazaki e aos Estúdios Ghibli, que vai decorrer esta semana, de quinta, 25, a sábado, 27 de Junho. Uma boa forma de comemorar os 30 anos dos Estúdios Ghibli, que se completam precisamente este mês.
Deixo-vos com o texto que escrevi para acompanhar o ciclo e que está também disponível no site do Cineclube.


MIYAZAKI E OS ESTÚDIOS GHIBLI

No preciso mês em que se comemora o trigésimo aniversário da criação, em Junho de 1985, pelos cineastas Hayao Miyzaki e Isao Takahata e pelo produtor Toshio Suzuki, dos Estúdios Ghibli, o lendário estúdio de animação japonês e os seus principais criadores estão em natural destaque no ciclo que o Cineclube de Tomar dedica este mês à animação japonesa.
Mesmo sem o saber, o público português que está actualmente entre os 30 e os 50 anos, já teve forçosamente contacto com o trabalho de Miyazaki e Takahata, mesmo que nunca tenham visto uma longa-metragem de animação dos estúdios Ghibli, pois estes dois criadores são responsáveis por inesquecíveis séries de animação, como Heidi, Marco, Ana dos Cabelos Ruivos e Conan, o Rapaz do Futuro, que passaram, por mais de uma vez, na televisão portuguesa.
E foi precisamente o sucesso dessas séries, não só em Portugal, mas no resto da Europa e no Japão, que ajudou a criar as condições para que, em 1984, os estúdios TopCraft desenvolvessem a primeira longa-metragem de animação de Miyazaki, baseado num mangá (uma Banda Desenhada japonesa) do próprio autor, Nausicaa of the Valley of the Wind. Ficção pós-apocalíptica, com um sopro épico e uma forte componente ecológica, Nausicaa foi um grande sucesso, que incentivou Miyazaki e Takahata a comprarem os estúdios TopCraft, então à beira da falência e criarem os estúdios Ghibli
Com três nomeações e um óscar para o Melhor filme de Animação, atribuído a A Viagem de Chiiro, o japonês Hayao Miyazaki é um nome maior do cinema de animação mundial e tem naturalmente o destaque principal na programação deste ciclo de cinco filmes, assinando a realização de três desses cinco filmes.
Assim, na quinta-feira, 25 de Junho, os espectadores terão a oportunidade rara de ver num ecrã de cinema As Asas do Vento, o último filme de Miyzaki, de 2013, que em Portugal saiu directamente em DVD. Derradeiro filme de Miyazaki como realizador, pois o cineasta declarou no Festival de Veneza de 2013, que se ia reformar, As Asas do Vento, que foi nomeado para o Óscar de Melhor Animação, é uma biografia de Jiro Horikoshi, o criador do famoso Mitsubishi A6M Zero, o avião usado pelos japoneses durante a 2ª Guerra Mundial.
Extremamente poético e melancólico, com toques fellinianos e uma extraordinária beleza plástica, As Asas do Vento é visto como o filme-testamento de Miyazaki, não só pelo tema da aviação, bem presente em outros filmes do realizador, como Nausicaa, ou Porco Rosso, mas até pelo próprio título, que remete para a criação dos Estúdios Gihibli, pois Ghibli é o nome árabe do Sirocco, um vento quente vindo do Mediterrâneo, termo escolhido porque o estúdio queria fazer soprar um “vento de mudança no mundo da animação”.
Na sexta-feira, dia 26, chega a vez da programação infantil, com a exibição pelas 15h30m, em versão dobrada em português, de O Castelo Andante, filme dirigido por Miyazaki, em 2004, que adapta o livro Howl's Moving Castle, de Diana Wynne Jones. Uma obra que narra as aventuras de Sophie, uma adolescente que é transformada por uma bruxa, numa velha de 90 anos. Misturando a fantasia com um ambiente steampunk, O Castelo Andante é um bom exemplo da capacidade de Miyazaki de criar filmes que agradam tanto às crianças, como aos adultos.
Finalmente, no sábado dia 27, o ciclo de animação japonesa dos Estúdios Ghibli termina em beleza, num dia verdadeiramente em cheio, que contempla a exibição de três filmes, dois dirigidos ao público mais novo, em versões dobradas e o último em versão original com legendas em português.
Logo a abrir o dia, às 11h, temos O Reino dos Gatos, o único filme deste ciclo que não é dirigido por nenhum dos fundadores dos Estúdios Ghibli. Realizado por Hiroyuki Morita, em 2002, O Reino dos Gatos, foi concebido inicialmente como uma curta-metragem de 20 minutos, encomendada por um parque temático japonês sobre gatos, mas o estúdio ficou tão entusiasmado com o trabalho de Morita e com o carisma de Haru, o personagem principal, que decidiu transformar a curta-metragem, numa longa-metragem para cinema, que levou três anos a terminar.
Pelas 15h30m passa o mais popular (e também o mais premiado) filme de Miyazaki, A Viagem de Chihiro. Realizado por Miyazaki em 2001, o filme ganhou o Urso de Ouro no Festival de Berlim de 2002 e o Óscar de de Hollywood para a Melhor Animação em 2003. Ao reconhecimento crítico, aliou-se o apoio do público, pois A Viagem de Chihiro destronou o Titanic de James Cameron do primeiro lugar do box office japonês, tornando-se o maior sucesso de bilheteira da história do cinema japonês, com o público a aderir em massa à viagem iniciática de Chihiro, uma menina de 10 anos que vai parar a um mundo mágico, onde os pais são transformados em porcos e ela é obrigada a trabalhar como criada para os Kami, as criaturas mágicas do folclore japonês, presentes em outros filme de Miyazaki, como O Meu Vizinho Totoro.
Para terminar o ciclo, temos às 21h30m de sábado, O Conto da Princesa Kaguya, de Isaho Takahata, um filme de 2014, que é a última produção dos Estúdios Ghibli, cuja actividade foi bastante reduzida, depois da passagem à reforma de Miyazaki.
Realizado por Takahata, o autor do magnífico O Túmulo dos Pirilampos, num estilo de grande depuração visual e elegância estilizada, que o afasta da imagem gráfica mais habitual dos Estúdios Ghibli, tal como de resto acontecia com outro de filme de Takahata, Os Meus Vizinhos Yamada, o Conto da Princesa Kaguya é baseado numa lenda tradicional japonesa e foi nomeado para o Óscar de Melhor Filme de Animação.
Cinco filmes, entres as mais de vinte longas-metragens realizadas até ao momento pelos Estúdios Ghibli, que espelham a qualidade e a diversidade da produção do mítico estúdio japonês e dos seus criadores. Homens de grande talento e sensibilidade, que criaram verdadeiras obras-primas da animação, pensadas principalmente para um público infanto-juvenil, mas que não deixam de conquistar os adultos que ainda não perderam a capacidade de sonhar e de se maravilhar. Ou seja, todos aqueles que gostam de cinema.

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Caçador de Autógrafos III - François Schuiten

Numa altura em que este blog tem estado bem mais parado do que eu gostaria, por causa das aulas e da nova colecção da Marvel que a Levoir vai lançar com o Público este Verão, lembrei-me de recuperar uma secção que tem andado bastante esquecida. Essa secção é o Caçador de autógrafos, em que mostro as "dedicaces" que me fez um determinado autor.
Agora chegou a vez de François Schuiten, um dos criadores da série As Cidades Obscuras e um autor tão simpático como talentoso, que nos deixou (a mim e ao João Ramalho Santos) explorar com grande cumplicidade o universo das Cidades Obscuras no livro As Cidades Visíveis, a cujo lançamento, em 1998, o próprio Schuiten fez questão de estar presente. Aquando da exposição Coimbra na Banda Desenhada, em 2003, Schuiten não pode estar presente fisicamente, mas fez o magnífico cartaz da exposição, que podem ver na imagem seguinte.
Desde essa altura, para além de duas idas a Bruxelas e das diversas visitas de Schuiten e Peeters ao Festival da Amadora, encontrámo-nos algumas vezes em Angoulême, durante o Festival de BD. Curiosamente, tal como aconteceu com os anteriores desenhadores presentes nesta secção (Eduardo Risso e Baudoin) também tenho um original de Schuiten, para além dos desenhos que me fez nos livros. Neste caso, uma das três ilustrações originais que fez para as Cidades Visíveis, com base nas fotografias de Coimbra que lhe mandei e que ele generosamente nos ofereceu
Para terminar, deixo-vos com imagens de De Schuiten à Geluck, um divertido portfólio com 20 ilustrações feito a duas mãos entre Schuiten e Geluck,(o autor da série Le Chat) em que cada um completa um desenho do outro. Um objecto tão curioso como raro, que Schuiten me deu de uma das vezes que estive em casa dele, em Bruxelas.
Cartaz para a exposição Coimbra na Banda Desenhada
Ilustração Original para o livro As Cidades Visíveis
Desenho no livro La Tour (1997)
Desenho no catálogo da Maison Autrique 
Desenho no livro Les Murailles de Samaris
Desenho no livro L'Ombre d'un Homme
Desenho na versão de grande formato do livro L'Archiviste
Uma das capas do portefólio De Schuiten à Geluck
A outra capa do portefólio
Um dos 20 desenhos que compõem este portefólio
Uma homenagem ao Tintin feita por Geluck e Schuiten

quarta-feira, 3 de junho de 2015

Diário de Notícias celebra o Mês da Ilustração em Setubal com edição ilustrada

A ideia não é nova, nem sequer em Portugal, mas é sempre bem-vinda. A edição de terça-feira, 2 de Junho de 2015, do Diário de Notícias troca as habituais fotografias pelo trabalho dos principais ilustradores nacionais. Este tipo de iniciativa é habitual em França, onde todos os anos, por altura do Festival de Angoulême o jornal Liberation surge ilustrado pelos principais autores de BD e ilustradores francófonos. por cá, na altura do Salão Lisboa, também o Público abriu as páginas à BD e à ilustração, numa iniciativa coordenada por João Paulo Cotrim, que também está à frente deste D.N. ilustrado que hoje esteve nos quiosques.
Com um desenho de André Carrilho na capa e um cartoon de João Abel Manta na última página, esta edição conta com imagens dos principais ilustradores nacionais, como Alex Gozblau, João Fazenda, João Maio Pinto e Nuno Saraiva, entre muitos outros.
Um dos pretextos para esta iniciativa é o evento É Preciso Fazer um Desenho?, um conjunto de mostras de ilustração, comissariadas por João Paulo Cotrim e Jorge Silva. Estas exposições vão animar a cidade de Setúbal durante este mês de Junho, mas a iniciativa começou logo no dia 31 de Maio com uma exposição dedicada a André Carrilho, o mais prestigiado ilustrador português contemporâneo a nível internacional, estando previstas também mostras dedicadas a Maria Keil, Lima de Freitas, João Abel Manta e Manuel João Vieira, que irão sendo inauguradas ao longo deste mês.
Se tudo correr como previsto, conto trazer-vos aqui, lá mais para o fim do mês, um punhado de imagens desta iniciativa a não perder por quem gosta de BD e ilustração.