quinta-feira, 30 de abril de 2015

Colecção Novela Gráfica 10 - O Diário do meu Pai, de Jiro Taniguchi


TANIGUCHI REGRESSA AO PASSADO COM O DIÁRIO DO MEU PAI

Novela Gráfica – Vol. 10

O Diário do meu Pai
30 de Abril
Argumento e Desenho – Jiro Taniguchi
Por + 9,90€

Na próxima quinta-feira, a colecção Novela Gráfica acolhe Taniguchi, o mais ocidental dos autores japoneses, com O Diário do meu Pai, uma história intimista e plena de sensibilidade, com laivos autobiográficos, considerada como um dos mais importantes trabalhos do autor nipónico.
Nascido em 1947 em Tottori, no Japão, Jiro Taniguchi começou a sua vida profissional como empregado de escritório, até descobrir que aquilo que queria realmente fazer era desenhar. Nos inícios dos anos 70, começou a publicar os seus trabalhos em diversas revistas japonesas, dando início a uma carreira sólida e prestigiada. Grande conhecedor da BD franco-belga e admirador confesso de autores como Moebius, Schuiten e Tito, Taniguchi, que já desenhou um argumento de Moebius, colaborou com Boilet e Peeters em Tokio est mon Jardin, foi o único autor japonês a ganhar dois prémios em Angoulême, o maior Festival de BD europeu, que lhe dedicou uma grande exposição em 2015.
Em O Diário do meu Pai, Taniguchi conta-nos a história de Yoichi Yamashita um designer que vive em Tóquio e regressa a Tottori, a sua terra natal, depois de uma longa ausência, para o funeral do seu pai. Um regresso às suas raízes, que o leva a evocar a infância e a perceber finalmente o verdadeiro motivo por que o pai abandonou a família.
Taniguchi queria contar uma história que tivesse a sua terra natal, Tottori, como cenário, mas, como refere numa entrevista a Benoit Peeters: “quando me pus a reflectir na história, apercebi-me que, de facto, não sabia quase nada sobre o meu pai. Imaginei então uma personagem que regressa à sua terra natal para descobrir quem era verdadeiramente o seu pai. Comecei a fazer as pesquisas, voltei a Tottori para recolher documentação e aos poucos, a história nasceu (…) A história é inventada, mas os sentimentos e o espírito da história resultam da minha experiência pessoal. Tinha em relação ao meu pai o mesmo tipo de sentimentos que estão descritos no livro. No fundo, durante a minha juventude, tinha a ideia que não queria ser como ele. Achava que a vida do meu pai não era uma vida interessante. Mas depois, descobri que afinal não era bem assim, e é isso mesmo que tento transmitir neste livro”.
Não sendo a primeira vez que os leitores portugueses têm oportunidade de descobrir o trabalho de Taniguchi, pois O Homem que Caminha foi editado em 2005 na Série Ouro da Colecção Clássicos da Banda Desenhada, foi preciso esperar 10 anos para o poder voltar a ler novamente em português, mas desta vez numa edição em capa dura, traduzida directamente do japonês. Também por isso, valeu a pena a espera!
Publicado originalmente no jornal Público de 24/04/2015

quinta-feira, 23 de abril de 2015

Colecção Novela Gráfica 9 - Sharaz-De: Contos das Mil e Uma Noites, de Sergio Toppi


Desta vez, o espaço que o Público me disponibilizou foi bastante mais reduzido do que o habitual, devido ao destaque (natural e compreensível) que o jornal deu à reedição facsimilidada da mítica revista Orfeu. Assim, para além do texto de apresentação, demasiado curto para a importância do livro e para a genialidade do trabalho gráfico de Sergio Toppi, deixo-vos aqui o link do texto que escrevi sobre Toppi para a revista Bang!, aquando da morte do desenhador italiano, e com um punhado de imagens do mais bonito livro desta colecção, que chega hoje aos quiosques de todo o país.

TOPPI REINVENTA AS MIL E UMA NOITES EM SHARAZ-DE

Novela Gráfica – Vol. 9
Sharaz-De: Contos das Mil e Uma Noites
23 de Abril
Argumento e Desenho – Sergio Toppi
Por + 9,90€
No próximo volume da colecção Novela Gráfica, vai estar em destaque o imenso talento de Sergio Toppi, o mestre italiano que é o autor de Sharaz-De, uma adaptação única dos contos das Mil e Uma Noites, considerada como a sua obra-prima.
Nascido em Milão, em 1932, Toppi foi um dos mais inovadores e talentosos desenhadores europeus, premiado no Festival de Lucca de 1992, com o Yellow Kid para Melhor Desenhador. Em 1979, realizou para a revista italiana Alter Alter um conjunto de oito contos inspirados pelas Mil e Uma Noites, reunidos sob o título Sharaz-De. Face ao sucesso da edição francesa de Sharaz-De, publicada em 2000, a sua editora propôs-lhe criar uma continuação, com três novas histórias.
É a edição integral deste clássico incontornável da banda desenhada que os leitores podem descobrir, já na próxima semana. Uma oportunidade única de admirar o seu desenho deslumbrante, em que as personagens parecem cristalizadas numa natureza ameaçadora, o fantástico que emerge das suas histórias e a forma única de pulverizar a estrutura clássica da página, em que a divisão tradicional em tiras e quadrados, dá lugar a uma planificação mais dinâmica e artística, que considera a página como um todo, criando composições de grande equilíbrio e dinamismo. Elementos que fazem da obra de Toppi, algo único e inesquecível.
Publicado originalmente no jornal Público de 17/04/2015

terça-feira, 21 de abril de 2015

Primeiro Teaser de Batman vs Superman já está online



Previsto para ser divulgado apenas hoje, o primeiro teaser de Batman Vs Superman: Dawn of Justice, já está disponível desde o fim-de-semana, depois de alguém no Brasil ter colocado on-line uma versão pirata.
O filme, dirigido por Zack Snyder, que já tinha dirigido Man of Steel, o último filme do Superman, só estreia no Verão de 2016, mas a expectativa é muita por se tratar do primeiro encontro dos dois maiores heróis da DC no cinema e de se saber que o filme prepara o caminho para a longa metragem da Liga da Justiça, ao introduzir pelo menos dois outros super-heróis, Wonder Woman, interpretada por Gail Gadot e Aquaman, interpretado por Jason Momoa, o Kahl Drogo da série Game of Thrones, que já tinha sido o último Conan.
A escolha de Ben Afleck para o papel de Batman causou grande agitação na Net quando foi divulgada, mas pelo teaser parece que vamos ter um Batman convincente e muito próximo do imaginado por Frank Miller em The Dark Knight Returns, história aonde este filme buscar óbvia inspiração. Um primeiro trailler só deve sair lá mais para o Verão, muito provavelmente durante a Comic Con de San Diego, mas para já temos este teaser, onde podemos ver o Batman de Ben Afleck, o novo Batmobile e o Batplane e ouvir a voz de Jeremy Irons como Alfred.
E se forem aqui, podem ver um vídeo que mostra mais em pormenor o novo fato do Batman, claramente inspirado no Batman do Dark Knight Returns e ter uma visão bastante mais detalhada do novo Batmobile
Interessantes e graficamente muito bem conseguidos, são os dois primeiros posters, que aqui vos deixo, tal como o teaser, legendado em português do Brasil. Enjoy!


quinta-feira, 16 de abril de 2015

Colecção Novela Gráfica 8 - Em Busca de Peter Pan, de Cosey


NOS ALPES SUÍÇOS, À PROCURA DE PETER PAN

Novela Gráfica – Vol. 8

Em Busca de Peter Pan
16 de Abril
Argumento e Desenho – Cosey
Por + 9,90€

Na próxima quinta-feira a colecção Novela Gráfica abre as suas portas ao suíço Cosey, um autor bem conhecido dos leitores portugueses em geral e dos leitores do Público em particular, pois esteve presente com trabalhos seus nas colecções Clássicos da Revista Tintin e Os Incontornáveis de Banda Desenhada, distribuídas com este jornal.
Nascido em 1950, perto de Lausanne, na Suíça, Bernard Cosandey, que os leitores conhecem como Cosey, estreou-se na BD no início dos anos 70, pela mão do seu compatriota Derib, o criador de Yakary e Buddy Longway. Justamente conhecido e premiado pelo seu trabalho na série Jonathan, título incontornável da revista Tintin, Cosey, com Em Busca de Peter Pan, abandona pela primeira vez o seu herói e alter-ego e troca temporariamente as montanhas do Tibete onde decorrem as aventuras de Jonathan, pelos Alpes suíços, que se revelam o cenário ideal desta história de grande poesia e sensibilidade.
 Passada em 1930, a narrativa acompanha Melvin Z. Woodworth, um jovem escritor britânico que vem procurar inspiração para o seu terceiro romance na aldeia de Ardolaz, nos Alpes valesianos, onde tinha estado seu meio-irmão, Dragan Z. Zmadjevic, um músico e compositor, que ali faleceu 10 anos antes. Uma viagem ao passado, pontuada por citações do Peter Pan de James M. Barrie, em que a paisagem da montanha, que Cosey retrata como ninguém, se assume como uma personagem de pleno direito.
Obra que lhe permitiu fugir ao limite das 48 páginas do álbum tradicional, Em Busca de Peter Pan, representa um decisivo passo em frente no percurso de Cosey como criador. Como o próprio refere, Em Busca de Peter Pan foi “o meu primeiro one-shot, feito por volta de 1985, para a colecção Histoires et Légendes da Lombard. Na altura, estava profundamente empenhado na série Jonathan, que estava em grande. Os álbuns vendiam-se cada vez mais, mas sentia vontade de sair por algum tempo daquela rotina. Há muito tempo que queria fazer uma história que se passasse nos Alpes valesianos, que conheço muito bem. O meu editor estava um pouco receoso e disse-me: “O Tibete, sim, pode interessar a muita gente. Mas uma história nos Alpes valesianos, só vai interessar a três suíços…” Mas na editora perceberam que eu tinha necessidade dessa mudança, mas não estavam à espera é que o livro vendesse tão bem, ou até melhor, do que o Jonathan. E sobretudo, Em Busca de Peter Pan é um livro que teve, e tem, uma longa vida.”
Publicado inicialmente em dois volumes, Em Busca de Peter Pan juntou o sucesso comercial ao reconhecimento crítico, traduzido   no Prémio do Público na Convention de la Bande Dessinée de Paris, em 1984 e no Grand Prix da cidade de Sierre em 1985. Mais tarde o livro foi publicado num único volume e integrado na colecção Signé, a linha de prestígio da Lombard, E, confirmando essa longa vida que é a marca dos clássicos, Em Busca de Peter Pan chega finalmente a Portugal, dando a conhecer aos leitores nacionais, tanto aos que sonharam ao lado de Jonathan, como os que estão agora a descobrir o trabalho de Cosey pela primeira vez, a obra mais emblemática do autor suíço e a sua primeira novela gráfica.
Publicado originalmente no jornal Público de 10/04/2015

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Colecção Novela Gráfica 7 - O Livro do Mr. Natural. de Robert Crumb

ROBERT CRUMB CHEGA À COLECÇÃO NOVELA GRÁFICA 
COM MR. NATURAL

Novela Gráfica – Vol. 7 

O Livro de Mr. Natural
Argumento e Desenhos – Robert Crumb
Quinta, 09 de Abril
Por + 9,90€

Depois de Will Eisner a abrir, Robert Crumb, outro grande nome da novela gráfica americana, não podia faltar numa colecção como esta, que pretende dar a descobrir ao leitor português o melhor da banda desenhada de autor, a nível mundial.
Nome maior dos comix underground e um dos símbolos da contracultura americana dos anos 60, Robert Crumb está presente na colecção Novela Gráfica com uma selecção das melhores histórias de Mr. Natural, originalmente publicadas entre 1967 e meados da década de 90. Não sendo a sua personagem mais popular, distinção que pertence a Fritz, the Cat, muito por via do filme de animação que Ralph Bakshi lhe dedicou em 1972, Mr. Natural é a personagem mais constante ao longo da obra de Robert Crumb e a que melhor revela o seu humor cáustico e o seu total desprezo pelas regras do politicamente correcto, que estiveram na origem de acusações de racismo e sexismo, em relação ao seu trabalho.
Mr. Natural é um pequeno guru californiano de longas barbas e origem misteriosa, com aparentes poderes místicos, mas que se comporta de forma muito pouco condizente com eles, deixando o leitor na dúvida se estaremos perante um místico genuíno, ou perante um simples aldrabão. Para além da crítica à sociedade americana da época, a série vive muito da interacção entre Flakey Foont, o seu principal discípulo e Mr. Natural, uma relação que vai evoluindo, à medida que o próprio Flakey se vai “aburguesando”, acabando por virar as costas ao seu antigo guru, e optar por uma vida de classe média nos subúrbios.
Nascido em Filadélfia em 1943, Crumb estreou-se profissionalmente como desenhador em 1962, numa companhia de cartões de boas festas de Cleveland, mas foi no final dos anos 60 que a sua carreira na BD arrancou, graças à revista Zap Comix!, titulo escrito, desenhado e publicado pelo próprio Crumb, que rapidamente se tornou um sucesso junto da comunidade underground. Para além de uma vastíssima produção, dividida entre a Banda Desenhada e a ilustração, que inclui uma adaptação integral do Livro do Génesis e uma biografia de Franz Kafka, Crumb é também um apaixonado pela música, tocando banjo numa banda, Les Primitifs du Futur, e tendo ilustrado capas para inúmeros discos de jazz, blues e rock. Crumb está radicado em França desde 1991, país que lhe atribuiu o Grande Prémio do Festival de Angoulême em 1999 e lhe consagrou uma grande exposição no Museu de Arte Moderna, em Paris, em 2012.
Em Portugal, com excepção da biografia de Kafka que fez com David Zane Mairowitz e de uma história curta do gato Fritz, publicada em 1979 no jornal Lobo Mau, a obra de Crumb permanecia inédita. Uma lacuna que esta colecção vai ajudar a corrigir, já esta quinta-feira.
Publicado originalmente no jornal Público de 03/04/2013

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Saga, o épico familiar de Brian k. Vaughan e Fiona Staples



 Imaginem a história de Romeu e Julieta, mas com os dois amantes de Verona a trocarem uma morte romântica por uma vida em conjunto, com a filha que nasceu deste amor proibido. Em seguida troquem a Verona do século XVI pelo espaço sideral, juntem uma pitada de humor à história e dêem à Julieta uma personalidade forte e o resultado é a série Saga, um dos maiores sucessos dos Comics americanos dos últimos anos que, por uma vez, também está disponível em Portugal, numa bela edição em capa dura da G Floy.
Criada pelo Argumentista Brian K. Vaughan e pela Ilustradora Fiona Staples, Saga é um dos melhores exemplos dos novos caminhos que a Editora Image tem percorrido e que fazem dela a mais interessante editora de Comics do mercado americano actual e uma das de maior sucesso. Embora a série tenha começado a ser publicada nos EUA em Março de 2012, a verdade é que o conceito inicial é muito anterior, remontando à infância de Vaughan que refere "foi um universo ficcional que criei quando estava aborrecido nas aulas de matemática e que, a partir daí foi crescendo". Mas o click definitivo só aconteceria quando o escritor foi pai de uma menina. Nas palavras de Vaughan, "queria escrever sobre a experiência de ser pai, mas queria arranjar uma espécie de Cavalo de Tróia que me permitisse encaixar esse tema numa história interessante que desse para explorar os pontos de contacto entre a criação artística e a responsabilidade de criar um filho. "
E o escritor concretiza: "apercebi-me que fazer Comics e fazer filhos são coisas muito parecidas e que podia combinar as duas coisas numa mesma história e essa história seria muito menos chata se a ambientasse num universo alucinado que misturasse ficção científica e fantasia, em vez de me limitar a contar anedotas sobre mudar fraldas.(...) Não queria contar uma aventura tipo Star Wars, com todos esses nobres heróis a combater um Império. Interessava-me mais contar a história das personagens secundárias, que só querem escapar a uma guerra sem fim".
 Quando o projecto foi divulgado pela primeira vez na San Diego Comic Con de 2011, o departamento de comunicação da Image apresentou Saga como "Star Wars encontra Game of Thrones", uma descrição apelativa, mas que não faz inteira justiça ao conceito por trás da série de Brian K. Vaughan e Fiona Staples, pois se Saga se aproxima da saga épica de George R. R. Martin na presença da magia e no acompanhar de diferentes personagens que procuram sobreviver num mundo em guerra, essa guerra não é o centro da história. No centro da história estão as pessoas. Ou, para usar uma comparação feliz de Vaughn: “sempre achei que a guerra era tão importante para a nossa história, como era para a do filme Casablanca. Ou seja, era muito importante, mas não tão importante como as vidas das pessoas cuja história o filme conta”.
Por isso, o tom da BD de Vaughan e Staples acaba por estar mais próximo de comédias românticas como Modern Family, o que só demonstra a capacidade do autor de chegar a diferentes públicos, algo que esteve sempre presente na obra de Brian K. Vaughan. Por isso, para além da aventura, da magia, dos combates, temos um jovem casal com um filho recém-nascido, que tem de aprender a viver com essa nova realidade e que, num cenário fantástico e delirante, se debate com problemas iguais aos de qualquer jovem casal, desde a chegada dos sogros, que fecha o primeiro volume, ao reaparecimento de uma antiga namorada de Marko. Mas a pressão da vida familiar não afecta apenas os heróis da história, pois também o seu principal adversário, o Príncipe Robot IV, preferia estar em casa a acompanhar a gravidez da sua mulher e o nascimento do seu primeiro filho, em vez de ter que percorrer o cosmos em perseguição dos amantes fugitivos.
 Com uma carreira dividida entre a Banda Desenhada e a televisão (foi um dos argumentista de Lost e é produtor de Under the Dome, a série televisiva baseada no romance de Stephen King com o mesmo nome) Vaughan foi responsável por duas das mais interessantes séries de comics deste século, que partem de cenários típicos de ficção científica, para uma reflexão sobre o mundo em que vivemos. Foi o caso de Ex-Machina, série publicada pela Wild Storm, sobre um antigo super-herói que se torna Presidente da Câmara de Nova Iorque e que acaba por perceber que a política implica concessões e escolhas morais pouco consentâneas com os ideais defendidos por um super-herói.
Mas o seu trabalho mais conhecido, é Y, the Last Man, série da Vertigo, ilustrada por Pia Guera, que explora a vida de um homem num mundo em que toda a população masculina foi dizimada por um vírus e apenas as mulheres sobreviveram. Uma premissa típica de um episódio da série televisiva Twilight Zone, mas que Vaughn desenvolve de forma bastante interessante e inesperada.
 Em Portugal, até à publicação de Saga pela G Floy, apenas tinham sido editados O Juramento, uma aventura do Dr. Strange, ilustrada pelo espanhol Marcos Martin, publicada na primeira colecção que a Levoir e o jornal Público dedicaram à Marvel e o excelente Fábula de Bagdad, baseado na história verídica de um bando de leões que escapou do zoo de Bagdad durante a Guerra do Golfo, magnificamente ilustrada pelo canadiano Niko Henrichon, que a BD Mania editou em Portugal na década de 2000.
 Mas voltemos a Saga, para vermos mais em pormenor os principais protagonistas desta aventura cósmica, sobre as dificuldades de se criar uma filha, ainda para mais quando se pertence a espécies diferentes, que se guerreiam até à morte e se está no centro de uma guerra espacial.
Para além de Marko e Alana, o casal multirracial cuja história de amor está no centro da intriga, temos também Hazel, a filha do casal, a cujo nascimento assistimos nas primeiras páginas do livro e que narra a história. Um dispositivo narrativo, a “voz of”, que Vaughn utiliza aqui pela primeira vez numa BD, com excelentes resultados. Mas como na maioria das boas histórias, os personagens secundários são também importantes e carismáticos. Veja-se o mercenário A Vontade, uma mistura de Han Solo e Boba Fett, para voltarmos à comparação entre Saga e Star Wars, que tem uma grande vantagem sobre Han Solo, ao contar com um companheiro muito mais carismático do que o peludo Chewbaca, que é a fabulosa Gata Mentirosa. Um animal que entra de caras para a lista dos mais inesquecíveis animais da história da Banda Desenhada, muito por força do excelente trabalho gráfico de Fiona Staples, que lhe dá uma extraordinária expressividade.
 Com um estilo que está longe de ser imediatamente consensual, o que faz com que o famoso slogan de Fernando Pessoas para a Coca-Cola, “primeiro estranha-se, depois entranha-se”, assente com uma luva ao seu grafismo singular. Senhora de um traço estilizado, tão simples como elegante, a que a cor digital dá profundidade, Staples foi escolhida por Vaughan, seguindo uma sugestão do escritor Steve Niles, que tinha trabalhado com a ilustradora canadiana na série Mystery Society. E Vaughan não podia nos elogios à sua companheira nesta aventura, afirmando: “a arte dela é incrível. Não se parece com nada. É completamente única”.
 Conquistando seis prémios Eisner e seis Prémios Harveys, os principais galardões da indústria dos comics e um Hugo, prémio máximo da ficção científica, em apenas dois canos, Saga tem aliado o reconhecimento crítico ao sucesso comercial. Um sucesso que se está a concretizar também em Portugal, em que o segundo volume de Saga já deverá já estar nas livrarias nacionais quando este número da revista Bang! chegar à FNAC.
ACTUALIZAÇÃO - O 2º volume da série Saga vai ser distribuído na 2ª quinzena deste mês de Abril, juntamente com o 2º volume da série Fatale, de Ed Brubaker e Sean Phillips, que a G Floy também está a publicar em Portugal.
Texto originalmente publicado no nº 17 da revista Bang!, em Março de 2015.

quinta-feira, 2 de abril de 2015

Colecção Novela Gráfica 6 - A Arte de Voar, de António Altarriba e Kim

A ARTE DE VOAR, OU O MERGULHO NO PASSADO

Novela Gráfica – Vol. 6 
A Arte de Voar
Argumento – Antonio Altarriba  
Desenhos – Kim
Quinta, 02 de Abril
Por + 9,90€
Na próxima quinta-feira os leitores portugueses vão poder descobrir a mais premiada das novelas gráficas espanholas: A Arte de Voar, de António Altarriba e Kim, um mergulho na história do século XX espanhol, tendo por base a experiência pessoal do pai do autor, o escritor e professor universitário António Altarriba, a que o desenhador Kim dá corpo.
Publicado originalmente em 2009, A Arte de Voar começou por ganhar o Prémio Calamo desse ano, para no ano seguinte arrebatar todas as mais importantes distinções espanholas, começando pelo Prémio Nacional da Catalunha (Comic), pelos troféus de Melhor Obra, Melhor Argumento e Melhor Desenho de autor espanhol do Salão do Comic de Barcelona, para culminar no Prémio Nacional do Comic de 2010. Um palmarés impressionante, revelador do impacto crítico de uma obra que extravasa o âmbito da Banda Desenhada e que afirma (e confirma) a força da novela gráfica no país vizinho.
Biografia de Antonio Altarriba Lope, nascido em 1910, em Peñaflor, numa aldeia perto de Saragoça, A Arte de Voar tem por base as memórias que Altarriba deixou escritas quando, em 2001, decidiu pôr termo à vida, lançando-se da janela do quarto andar do lar em que vivia. Memórias que o seu filho transformou numa narrativa poderosa, em que a vida de um homem que atravessou os momentos mais marcantes do século XX espanhol, com destaque para a Guerra Civil e para a 2ª Guerra Mundial, se (com)funde com a história do país.
Diz-se que, ao morrer, uma pessoa revive em segundos os principais acontecimentos da sua vida e é esse o mecanismo narrativo que Altarriba (filho) vai usar para contar a história de Altarriba (pai), transformando os poucos segundos da queda para a morte de Antonio Altarriba Lope em noventa anos de vida. O facto de o autor contar as memórias do seu pai, aproxima este livro de outro clássico da Novela Gráfica, o Maus de Art Spiegelman, mas aqui autor e personagem, pai e filho, acabam por se fundir no narrador: “o meu pai, que agora sou eu”, como refere o autor logo no início da história, enquanto que em Maus, a relação entre Art Spiegelman e o seu pai, Vladek, é marcada pelo antagonismo.
Relato sem concessões da dura realidade de um homem, romântico e anarquista, que vê ruir todos os seus sonhos e afundar todas as utopias por que lutou, A Arte de Voar, conta com o inspirado trabalho gráfico de Kim, cujo traço extraordinariamente detalhado, num estilo que oscila entre o hiper-realismo e a caricatura, dá corpo (e alma) às memórias de Antonio Altarriba Lope. De seu nome Joaquim Aubert i Puig-Arnal, o desenhador catalão Kim é um dos fundadores da revista satírica El Jueves, (título que pode ser visto como o equivalente espanhol da Charlie Hebdo) onde criou o emblemático Martinez, el Facha. Habituado ao registo das histórias curtas, Kim tem aqui o seu trabalho de maior fôlego e o mínimo que se pode dizer é que os dois anos passados a desenhar A Arte de Voar compensaram, pois permitiram dar vida a esta obra absolutamente incontornável, que o Público e a Levoir agora dão a descobrir aos leitores portugueses.
Publicado originalmente no jornal Público de 27/03/2015