sábado, 26 de abril de 2014

Estética, propaganda e Utopia no Portugal do 25 de Abril



Vai esta noite para o ar na RTP2, pelas 22h, o documentário de Paulo Seabra, Estética, Propaganda e Utopia no Portugal do 25 de Abril. Tal como aconteceu com o VER BD, a série documental sobre a Banda Desenhada portuguesa que Seabra realizou com Pedro Vieira de Moura, também desta vez gravei um depoimento sobre a BD e o cartoon, antes e depois do 25 de Abril, juntando a minha voz à de (bem mais) ilustres entrevistados, como o historiador Fernando Rosas e os designers Jorge Silva e Henrique Cayatte, entre outros. Aqui fica então o trailler.

ACTUALIZAÇÃO -  O documentário já está disponível no site da RTP e pode ser visto aqui


O Capitão Falcão está chegar!



Terminada a semana revolucionária do 25 de Abril e do 1º de Maio, é tempo para algo completamente diferente. Aqui vos deixo então com o super-herói preferido de Salazar, o Capitão Falcão. Personagem de culto que parodia a estética  e a ideologia do Estado Novo e séries de televisão como o Batman e Green Hornet, o Capitão Falcão esteve para protagonizar uma série de televisão em 2011, de que apenas se filmou o divertido episódio-piloto, cujo trailer pode ser visto aqui. Mas goradas as negociações com a RTP para a exibição da série, o herói fascista vai prosseguir a sua luta contra o comunismo no grande ecrã, na companhia do seu inseparável side-kick, o Puto Perdiz, de Salazar, e de Dom Afonso Henriques. Tudo isto num filme escrito e realizado por João Leitão,  que foi o produtor da série Um Mundo Catita, protagonizada por Manuel João Vieira e realizada pelo grande Filipe Melo.

A longa metragem que ainda não tem data de estreia, vai chegar às salas de cinema ainda este ano e, entre vários actores conhecidos, como Miguel Guilherme, Bruno Nogueira, José Pinto e Gonçalo Wadington, que faz de Capitão Falcão,e de David Chan, que além do papel de Puto Perdiz, é responsável pela coreografia das (excelentes) cenas de acção, conta ainda com Ricardo Carriço como Major Al...berto, numa óbvia alusão a outra personagem de culto que também teve direito a uma série televisiva, o famoso Jaime Eduardo de Cook e Alvega, mais conhecido por Major Alvega.
Esperemos que o sucesso do filme facilite a realização de uma série de TV, pois o Capitão Falcão ainda tem muitas aventuras para viver. Mas o melhor é esperar para ver como corre o filme nas bilheteiras e não fazer grandes planos, pois como bem diz o Capitão Falcão, elogiando a conhecida capacidade de improviso lusitana:" Somos portugueses. Não precisamos de planos!"


sábado, 19 de abril de 2014

Lá Fora - Charly 9, de Richard Guerineau e Jean Teulé


Publicado em França em finais do ano passado pela Delcourt, Charly 9 adapta à BD o romance de Jean Teulé sobre o Rei Carlos IX de França, que entrou para a História como o responsável pelo famoso massacre da noite de São Bartolomeu, em que vários milhares de protestantes huguenotes foram chacinados em Paris, por ordem da Coroa francesa, às mãos de católicos fervorosos. Uma personagem trágica que, perseguida pelos remorsos, vai morrer louco um ano depois, a suar sangue, com apenas 23 anos.

Este episódio sangrento da História de França, ocorrido na noite de 23 para 24 de Agosto de 1572, dia de São Bartolomeu, inspirou diversas obras de ficção, começando pelo livro A Raínha Margot, de Alexandre Dumas, (é a Dumas que se deve a propagação da lenda de que o Rei Carlos IX teria morrido a suar sangue, informação não referida na autópsia) adaptado ao cinema num filme de Patrice Cheréau, com Isabelle Adjani, particialmente filmado em Portugal, no Convento de Mafra.  Também George R. R. Martin foi buscar inspiração nesta tragédia real para a famosa cena do Casamento Vermelho, um dos momentos mais perturbadores da saga da Guerra dos Tronos. Mais recentemente, em 2011, o escritor francês Jean Teulé utilizou o mesmo ponto de partida para a biografia romanceada de Carlos IX, que esteve na base da BD de Richard Guérineau, que motiva este texto.
 Nomeado para os últimos  Prémios de Angoulême, Charly 9 acabou por não ganhar nada, o que me pareceu uma injustiça, pois trata-se de um excelente livro, dos melhores que li este ano, que explora de uma forma surpreendente as imensas potencialidades da linguagem da Banda Desenhada.
Tão mais surpreendente, pois os trabalhos anteriores de Guérineau não deixavam antever tamanha versatilidade e uma utilização tão criativa da herança clássica da BD franco-belga, que se adapta muito bem ao humor do texto original de Teulé, onde a comédia e a tragédia andam a par, bem evidente logo na cena inicial, em que a Raínha-mãe, Catarina de Médicis, e o resto da Corte manipulam o jovem Rei para ele dar a sua autorização para o massacre.
Nascido em 1969, Guérineau é conhecido sobretudo pelo seu trabalho como desenhador na série Le Chant des Stryges, escrita por Éric Corbeyran, tendo desenhado recentemente um álbum da série XIII Mystery, com argumento de Fabien Nury. Em ambos os casos, o seu trabalho mostrava um registo realista bastante clássico, que não deixava adivinhar  tamanha versatilidade gráfica.
Mas,muito  mais do que uma mera demonstração de virtuosismo vazia, Guérineau pretende, nas suas próprias palvras, "dar conta das mudanças de registo do texto de Teulé, através de rupturas gráficas, seguindo os capítulos, em tormo dos temas da morte, da loucura e do sangue".
E essas rupturas são bem evidentes, com o resgisto mais realista da cena inicial, em que o dramatismo é dado sobretudo pela cor e pela iluminação, a ser posteriormente substituído por cenas de alto contraste, quase monocromáticas, com um grau de estilização que não está longe do Sin City de Frank Miller, que transmitem bem a dimensão do massacre. Mas o mais curioso, são mesmo as homenagens inesperadas a Morris, o criador de Lucky Luke e, sobretudo a Peyo, com a descrição de uma caçada do Rei a ser mostrada como se se tratasse de uma história de Johan e Pirlouit.

Como referiu numa entrevista à revista Casemate:  "Com Charly 9, tinha vontade de mudar de época, de registo gráfico. Mas também de formato, com menos quadrados por prancha e, de tempos a tempos, com desenhos de página inteira. Perante a rotina de uma série como Le Vent des Stryges, estas histórias completas tornaram-se uma necessidade."
Face aos resultados conseguidos com este Charly 9, esperemos que Guérineau continue a intervalar os álbum de Le Chant des Stryges, série que já vai em 15 volumes, com as histórias em álbum que lhe permitem mudar de registo.
Os leitores agradecem!
E para terminar, deixo-vos com o belo trailler feito pela Editora para divulgar este livro.
Charly 9, de Teulé e Guerineau, Delcourt, 2013. à venda na Livraria Dr. Kartoon   

terça-feira, 15 de abril de 2014

Textos editoriais Marvel NOW! 2 - O Soldado do Inverno



Aqui está o meu segundo texto para as revistas da série Marvel NOW!, neste caso dedicado ao Soldado de Inverno, a propósito da estreia do segundo filme do Capitão América, que adapta a história de Ed Brubaker onde surge pela primeira vez o Soldado do Inverno.
Inicialmente previsto para sair no nº 3 da revista dos Vingadores, por uma questão de espaço, este texto acabou por sair na revista dos X-Men. Um título que eu nem sequer costumo seguir, mas a que vou ter que estar mais atento, pois o meu próximo texto sairá também nesse título, como verão em Maio...

O ESPIÃO QUE VEIO DO FRIO

Como bem sabem os leitores de histórias de super-heróis, para os personagens das suas histórias favoritas, a morte está longe de ter um caracter definitivo. Esta é uma realidade que atinge tanto heróis como vilões e que, é tão válida para a DC como para o universo Marvel, onde personagens como Elektra, Professor Xavier, Capitão América e Jean Grey, entre muitas outras, conseguiram voltar da última viagem. Esta situação é tão evidente que existe um aforismo, partilhado por muitos fãs dos comics de super-heróis e conhecido como a Cláusula Bucky, que diz que, nos comics “ninguém permanece morto, excepto o Bucky, Jason Todd e o Tio Ben”.
Na realidade, o tio Ben, que lembrou a Peter Parker que “com grandes poderes vêm grandes responsabilidades” e cuja morte serviu como motivação ao seu sobrinho para assumir essas mesmas responsabilidades e combater o crime como o Homem-Aranha, mantém-se a única excepção a essa cláusula (até ver…), pois Jason Todd, o segundo Robin, morto pelo Joker, acabou por regressar anos depois como o Capuz Vermelho, o mesmo sucedendo com Bucky, como veremos a seguir.
 Mesmo assim, Bucky Barnes está entre as personagens da Marvel que mais tempo se mantiveram mortas. O jovem ajudante (ou "sidekick") do Capitão América, que perdeu a vida no final da Segunda Guerra Mundial na sequência do acidente que deixou o Capitão América em estado de hibernação suspensa num bloco de gelo durante décadas, até ser descoberto pelos Vingadores, só foi ressuscitado em 2005 por Ed Brubaker no decorrer da sua memorável passagem pela série do Capitão América acabando até, na sequência da morte de Steve Rogers durante a Guerra Civil (uma saga publicada em Portugal pela Levoir/Público em 2012) por assumir as funções de Capitão América com um sucesso tal, que quase fez esquecer o original.
O personagem de Bucky Barnes apareceu pela primeira vez em 1941 na revista Captain America Comics, criado por Joe Simon e Jack Kirby, correspondendo ao gosto da época que preconizava que os heróis deviam ter um apoio de um pequeno ajudante, um sidekick, com o qual os jovens leitores se pudessem mais facilmente identificar e que, à semelhança de Robin em relação a Batman, acompanha o Capitão América na luta contra os inimigos da nação americana. Com o fim da guerra, a popularidade do Capitão América e de Bucky foi-se lentamente apagando, até a revista ser cancelada. Voltariam com a Guerra Fria em finais de 1953, mas seria um regresso sem glória, que não durou mais de 3 números, e ao qual não estiveram ligados Simon e Kirby. O Capitão América acabaria por regressar em 1964, já em plena era Marvel, graças ao esforço conjunto de Stan Lee e Jack Kirby, que souberam adaptar o herói dos anos 40 à realidade da década de 60.
Esse regresso dá-se nas páginas da revista Avengers # 4, com o grupo de super-heróis a descobrir o Capitão América dentro de um iceberg, onde jazia congelado desde o final da II Guerra Mundial, na sequência da explosão de uma bomba voadora criada pelo Barão Zemo, que custaria a vida a Bucky e atiraria o Capitão América para as águas geladas do Atlântico norte. Uma ideia engenhosa de Stan Lee, que permitiu recuperar o Capitão América para os anos 60, fazendo tábua rasa do caçador de comunistas dos anos da Guerra Fria, transformando o símbolo da América em guerra, numa figura mais frágil, afectada pelos problemas e as neuroses habituais no universo Marvel. Um indivíduo fora do seu tempo, a ter que aprender a viver numa época que não é a sua, atormentado pela morte do seu companheiro Bucky, cujas histórias vão reflectir as mudanças de uma América que vai passar pelos traumas do Vietname, pelo escândalo Watergate, pelo triunfalismo da era Reagan e pelo choque dos atentados de 11 de Setembro.
Ao longo desse percurso, o Capitão América contou com diversos aliados, com destaque para o Falcão, mas nenhum deles era menor de idade, pois Stan Lee, que nunca foi muito fã dos jovens sidekicks, achava que um super-herói que colocasse em perigo a vida de um menor, seria completamente irresponsável. Assim, a presença de Bucky nas aventuras do Capitão América ficou limitada aos flash-backs dos tempos da 2ª Guerra Mundial, até Ed Brubaker decidir romper a Cláusula Bucky, em O Soldado de Inverno, o arco inaugural da sua passagem pela revista do Capitão América. Nascido em 1966, Ed Brubaker começou a sua carreira a escrever e desenhar histórias policiais para editoras independentes, antes da Vertigo publicar algumas séries que assinou como argumentista e que lhe abriram as portas da DC e da Marvel.

Embora tenha escrito os principais heróis das duas editoras, o gosto pelo policial negro e pela espionagem estão sempre presentes nos seus trabalhos e o Soldado de Inverno introduz no universo do Capitão América elementos característicos das histórias de espionagem ambientadas na Guerra Fria. Com efeito, nas histórias escritas por Ed Brubaker e ilustradas por Steve Epting, descobrimos que o corpo congelado de Bucky foi descoberto por um submarino soviético e que os serviços secretos soviéticos que o vão conseguir fazer regressar à vida, lhe fizeram uma lavagem cerebral e o programaram para ser um assassino frio e extraordinariamente eficiente, sem qualquer lembrança do seu passado.
É precisamente esse arco de histórias que está na base do novo filme do Capitão América que, quando esta revista chegar às bancas, já estará em exibição nos cinemas de todo o país.
Dirigido por Anthony e Joe Russo, Capitão América: O Soldado do Inverno conta com argumento de Christopher Marcus e Stephen Mcfeely, que já tinham escrito o anterior filme do Capitão América e que prosseguem com a adaptação do herói ao mundo actual, colocando-o no centro de uma história de espionagem que vai abalar as convicções de Steve Rogers.
Mais do que uma história de super-heróis, este parece ser um filme de espionagem, que presta homenagem aos trillers políticos dos anos 70, aspecto reforçado pela presença de Robert Redford, actor que nos anos 70 esteve presente em Os Três Dias do Condor e Os Homens do Presidente, os dois mais importantes filmes desta tendência e que em Capitão América: O soldado de Inverno, veste a pele de Alexander Pierce, um director da S.H.I.E.L.D.
Brubaker, que leu o argumento e acompanhou as filmagens, não hesita em afirmar que “este vai ser o maior filme de super-heróis jamais feito.
Não me consigo lembrar de nenhum melhor e estou a contar com a trilogia do Cavaleiro das Trevas, do Christopher Nolan. É acima de tudo um triller e o facto de se tratar de um filme de super-heróis parece acessório. Está mais próximo de filmes como Os Três Dias do Condor, ou Missão Impossível, do que do filme dos Vingadores. Tem uma atmosfera fantástica e a forma como são filmadas as cenas de acção é muito excitante”.
No momento em que este texto foi originalmente escrito, não é possível ainda confirmar a opinião de Ed Brubaker, mas a avaliar pelo espectacular trailer, acredito que o prestigiado argumentista não estará a exagerar nos elogios.
Publicado originalmente na revista X-Men nº 3, de Abril de 2014.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Textos editoriais Marvel NOW! 1 - Homem-Aranha Superior



Na altura em que já chegou às bancas o nº 3 da revista dos X-Men, com o meu segundo texto para as revistas da linha Marvel Now!, que a Panini Espanha está a publicar directamente em Portugal, parece-me boa altura para recuperar o primeiro texto que escrevi para as publicações que assinalam o regresso das revistas mensais da Marvel, em bom português, aos quiosques nacionais.
Estes textos partiram de um convite do José de Freitas, editor assistente da Panini e responsável pela coordenação das edições portuguesas da Panini, à semelhança do que tem feito com as colecções da Marvel e da DC que a Levoir tem lançado com os jornais, quemais uma vez, me deu o prazer de trabalharmos juntos.
Embora o espaço aqui seja muito mais reduzido do que era nos editoriais da DC, a liberdade é bastante maior. Mesmo assim, confesso que, quando recebi o convite para escrever sobre o Homem-Aranha Superior, pensei duas vezes, pois a premissa base da série parecia-me perfeitamente idiota. Mas ainda bem que decidi ler as histórias, pois foram uma muito agradável surpresa e esta é, provavelmente, a melhor saga do Homem-Aranha que já li, desde a fase inicial do J. M. Strackzinsky que a Devir lançou em Portugal há uns bons 10 anos.


NA PELE DO INIMIGO

Um dos mais populares argumentistas da actualidade, Dan Slott é também um dos mais controversos, muito por força deste Homem-Aranha Superior, cuja premissa base causou tal agitação junto dos fãs do “cabeça de teia”, que Slott chegou até a receber ameaças de morte de leitores mais indignados. Com efeito, a ideia de fazer com que a mente do Dr. Octopus moribundo ocupasse o corpo de Peter Parker, com o vilão a assumir os poderes e as responsabilidades do Homem-Aranha, é tão controversa como arriscada. Mas a verdade é que estamos perante uma das melhores histórias do Homem-Aranha das últimas décadas, mesmo que este Homem-Aranha não seja o que nos habituámos a conhecer. Este é um Homem-aranha diferente e, em muitos aspectos, um Homem-Aranha superior, pois aos poderes que permitiram Parker a tornar-se um super-herói, alia uma capacidade estratégica e científica que o anterior Homem-Aranha não possuía.
Todos vimos, no nº 1 desta revista, a facilidade com que derrotou o novo Sexteto Sinistro, descobrindo os seus pontos fracos e atacando-os com a precisão de um cirurgião. Ou como soube jogar com os media dando ao Homem-aranha, que sempre foi um herói incompreendido, a popularidade que muitas vezes lhe faltou, conseguindo até conquistar o seu crítico mais feroz, J. Jonah Jameson, que trocou o quarto poder pelo segundo, tornando-se Mayor de Nova Iorque. E, pela forma como constrói a sua teia pela cidade, usando os drones-aranha para recolher informação, este Homem-Aranha Superior está mais próximo do insecto que lhe deu o nome os poderes, do que Peter Parker alguma vez esteve. 
Slott passou os primeiros anos da sua carreira escrevendo histórias dirigidas a um público mais infantil, como as adaptações à BD das séries de animação Ren And Stimpy, Scooby Doo, Looney Tunes e Powerpuff Girls, mas rapidamente provou ser capaz de tratar com igual eficácia temas bem mais adultos e sombrios, na mini-série Arkham Asylum: Living Hell, ilustrada por Ryan Sook. Esta mini-série, de 2003, foi o seu último trabalho para a DC, antes de regressar à Marvel (que editava a revista do Ren e Stimpy) para escrever a nova revista da Mulher-Hulk, antes de se tornar o principal argumentista da revista Amazing Spider-Man. Actualmente, um dos principais argumentistas da Marvel, Slott não esquece a “Distinta Concorrência” e, como vimos no nº anterior, goza com o Batsinal, numa divertida cena em que faz ver a Jameson que um sinal luminoso gigante que permita aos inimigos do Homem-Aranha saber exactamente onde ele se encontra, é capaz de não ser uma grande ideia, mesmo que o dito sinal acabe por se revelar de grande utilidade para derrotar o abutre… 
Nas histórias que vão poder ler a seguir, Dan Slott prossegue com a humanização de Otto Octavius, fazendo com que o leitor se vá identificando gradualmente com o antigo vilão, desenvolvendo de forma hábil a relação dele com Anna Maria Marconi, uma anã com quem tem grandes afinidades intelectuais. Mas mesmo que, à sua maneira, Octavius aproveite esta oportunidade de se tornar literalmente um homem novo, a agressividade e o desprezo pela vida humana que caraterizavam o Dr. Octopus estão ainda presentes na forma impiedosa com que o Homem-aranha Superior trata o Massacre, o Polichinelo e a Croma, os vilões que vai defrontar neste número. 
Se nas histórias anteriores a arte tinha sido assegurada por Ryan Stegman, neste número Dan Slott mostra que continua a saber escolher muito bem os desenhadores com quem colabora. O italiano Giuseppe Camuncoli, que alia uma bem-sucedida carreira nos comics americanos, iniciada na Vertigo, com uma série bem eclética de trabalhos na sua Itália natal, que além de romances gráficos com Matteo Casali, inclui histórias de Dylan Dog e a continuação dos Escorpiões do Deserto, de Hugo Pratt, encarrega-se de ilustrar num estilo realista o confronto com o Massacre, enquanto que o traço mais caricatural, que primeiro se estranha e depois se entranha, do mexicano Humberto Ramos se revela perfeito para a história em que o Polichinelo e a Croma põem à prova a (pouca) paciência do novo Homem-Aranha.
Publicado originalmente na revista Homem-Aranha Superior nº 2, de Março de 2014. 

sábado, 5 de abril de 2014

Capitão América regressa ao cinema em clima de conspiração


Já está nas salas de cinema nacionais desde quinta-feira, dia 27 de Março, o novo filme da Marvel, que traz de volta o Capitão América, para combater uma conspiração bem no coração dos serviços secretos americanos, que ameaça a liberdade do mundo ocidental.
Depois de um primeiro filme de ambiente mais “retro”, que explora as origens do Capitão América, durante a II Guerra Mundial, este 2º filme do Capitão América está mais próximo do ambiente de paranóia dos trillers de espionagem dos anos 70, que cruza com a recuperação de uma das histórias recentes, das mais importantes do personagem na BD, escrita por Ed Brubaker. Essa história, em que Brubaker introduz no universo do Capitão América elementos característicos das histórias de espionagem ambientadas na Guerra Fria, chama-se O Soldado de Inverno e assinala o regresso à BD de Bucky, o jovem ajudante do Capitão América, que estava oficialmente morto desde a II Guerra Mundial.
Com efeito, nessa história escrita por Ed Brubaker e ilustradas por Steve Epting, descobrimos que o corpo congelado de Bucky foi descoberto por um submarino soviético e que os serviços secretos soviéticos que o vão conseguir fazer regressar à vida, lhe fizeram uma lavagem cerebral e o programaram para ser um assassino frio e extraordinariamente eficiente, sem qualquer lembrança do seu passado, o Soldado do Inverno.
É precisamente esse o ponto de partida do filme Capitão América: O Soldado do Inverno dirigido por Anthony e Joe Russo, com argumento de Christopher Marcus e Stephen Mcfeely, que já tinham escrito o anterior filme do Capitão América e que prosseguem com a adaptação do herói ao mundo actual, colocando-o no centro de uma história de espionagem, que reflecte acontecimentos recentes como as acções de espionagem da NSA denunciadas por Edward Snowden, que vão abalar as convicções de Steve Rogers na política de segurança do país que jurou defender.

 Mais do que uma história de super-heróis (com a excepção da Viuva Negra, os outros membros dos Vingadores brilham pela ausência), ou sequer uma adaptação literal da BD de Brubaker, este é sobretudo um filme de espionagem, que presta homenagem aos filmes políticos dos anos 70, aspecto reforçado pela presença de Robert Redford, actor que nos anos 70 esteve presente em Os Três Dias do Condor e Os Homens do Presidente, os dois mais importantes filmes desta tendência e que em Capitão América: O soldado de Inverno, veste a pele de Alexander Pierce, um director da S.H.I.E.L.D que vai ter um papel muito importante na história.
Ed Brubaker, que leu o argumento e acompanhou as filmagens, não hesita em afirmar que “este vai ser o maior filme de super-heróis jamais feito. Não me consigo lembrar de nenhum melhor e estou a contar com a trilogia do Cavaleiro das Trevas, do Christopher Nolan. É acima de tudo um triller e o facto de se tratar de um filme de super-heróis parece acessório. Está mais próximo de filmes como Os Três Dias do Condor, ou Missão Impossível, do que do filme dos Vingadores. Tem uma atmosfera fantástica e a forma como são filmadas as cenas de acção é muito excitante”.

Visto o filme, a verdade é que Brubaker não exagera e este é, quanto a mim, o mais conseguido filme da Marvel até agora, com excelentes cenas de acção, uma intriga bem construída, um pouco menos de humor que os filmes do Homem de Ferro, ou dos Vingadores e excelentes interpretações, especialmente de Chris Evans, que está cada vez mais à vontade na pele do herói-símbolo da América. O maior senão talvez seja o facto da personagem do Soldado do Inverno não ser tão explorada como podia, nem ser explicado, como é que ele, sendo “criado” pelo KGB, acaba a trabalhar para a HIDRA… Mas alguns desses aspectos poderão vir a ser desenvolvidos em próximos filmes, até porque o contrato de Sebastian Stan, o actor que fez primeiro de Bucky e agora de Soldado do Inverno, contempla 6 filmes da Marvel.
O mais adulto dos filmes da Marvel, Capitão América: O Soldado do Inverno é claramente um passo em frente na consolidação do universo da Marvel no cinema, tão recomendável para os fãs do super-herói, como para quem gosta de uma boa história de espionagem.
A terminar, um aviso. Como é habitual nos filmes da Marvel, convém não sair do cinema mal acaba o filme e acompanhar a ficha técnica até ao fim, pois há, não uma, mas duas cenas extras, que preparam o caminho para os próximos filmes da “Casa das Ideias”.
 (“Capitão América: o Soldado do Inverno”, de Anthony e Joe Russo, com Chris Evans, Sebastian Stan, Scarlett Johansson e Samuel L. Jasckson, Marvel Studios, 2014. Em exibição em Coimbra nos cinemas Zon Lusomundo Dolce Vita e Fórum Coimbra) 
Versão integral do texto publicado no Diário As Beiras de 05/04/2014