sábado, 16 de fevereiro de 2013

Caprioli visto por Jorge Magalhães


Já tive ocasião de assinalar neste espaço, o excelente trabalho que o Festival de Moura tem feito no campo da edição, com a edição regular de uma série de publicações de interesse de e sobre BD. Nesse campo, merece especial destaque a coleção “Cadernos Jorge Magalhães”, constituída por monografias escritas pelo conhecido estudioso e argumentista de Banda Desenhada que, depois de ter partilhado com os leitores o seu imenso saber sobre O Western e a Ficção Científica na BD, e o Western na obra de Vítor Péon, recupera agora a beleza e elegância do traço do italiano Franco Caprioli, no centenário do seu nascimento, que se comemorou em 2012.
Ao contrário de outros compatriotas seus, como Sérgio Toppi, ou Dino Battaglia, Caprioli viu a maioria do seu trabalho publicado no nosso país, em revistas como o Cavaleiro Andante, Mundo de Aventuras e, mais tarde, o Jornal da BD, ou em álbuns como os recolheram as suas adaptações dos romances de Júlio Verne, sendo considerado pelos leitores nacionais como um mestre da aventura em estado puro, graças às suas histórias ambientadas em cenários exóticos e distantes, em que o mar se afirma como um personagem de direito próprio. A elegância do seu traço, marcado por um uso do pontilhado, cuja influência é visível em autores como Milo Manara, justifica a designação de desenhador poeta, que Magalhãs lhe atribui.
Jorge Magalhães que, com o rigor habitual e com evidente paixão, constrói uma completa biografia de Caprioli, magnificamente ilustrada com os mais diversos exemplos da obra do desenhador italiano nascido em 1912, incluindo bastante material inédito em Portugal, como uma bela história a cores de Olac, O Gladiador, feita para o mercado inglês. Muito bem impresso e com excelentes reproduções esta revista/fanzine é uma bela homenagem do Festival de BD de Moura ao talento imortal de Caprioli, mas não é a única, pois paralelamente, o GICAV, de Viseu lançou um e-book, em formato DVD, com bastante mais imagens do que as que couberam nas 60 páginas da revista editada por Moura, que o próprio Jorge Magalhães teve a gentileza de me oferecer. Uma bela iniciativa, que teria a ganhar se o dito e-book fosse mais facilmente navegável e estivesse num formato que lhe permitisse ser lido por IPads, podendo assim ser colocado à venda no Itunes, ou em lojas digitais do género. É que assim como está, não será nada fácil aos interessados ter acesso ao e-book, pois ao contrário da revista, que está à venda em Coimbra na Livraria Dr. Kartoon, o e-book, terá que ser pedido directamente ao GICAV. (“Franco Caprioli: No centenário do Desenhador Poeta”, de Jorge Magalhães, Câmara Municipal de Moura, 60 pags, à venda em Coimbra na Livraria Dr. Kartoon)
Versão integral do texto publicado no Diário As Beiras de 16/02/2013

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Evocando Corto Maltese



Apesar da morte de Hugo Pratt em 1995, ter ditado (pelo menos por enquanto) o fim das aventuras do seu principal herói, a popularidade de Corto Maltese continua bem alta, conquistando sucessivas gerações de leitores. E Portugal não foge à regra, tendo o ano de 2012 testemunhado dois exemplos dessa popularidade. O primeiro, que tive oportunidade de referir no meu blog, foi a magnífica exposição que a Fundação Eugénio de Almeida dedicou a Hugo Pratt. O segundo, que só agora aqui trago, foi a edição por Geraldes Lino, do nº 5 do seu mega-fanzine Efeméride, desta vez dedicado a Corto Maltese, lançado durante o último Festival de Beja.
Projecto ambicioso, até nas dimensões (um nada prático formato A3), iniciado em 2005, o fanzine Efeméride foi nas edições anteriores dedicado a Little Nemo, Príncipe Valente, Super-Homem e Tintin. Comparando com os volumes anteriores, este é, apesar das oscilações e desequilíbrios inerentes a um projecto colectivo desta natureza, o mais consistente dos volumes.
Uma obra só possível graças ao dinamismo e persistência de Geraldes Lino, que conseguiu juntar 45 autores, entre desenhadores e argumentistas, que assinam 43 histórias de uma página, todas inéditas (com a excepção da história de Marco Mendes, que recupera uma homenagem ao quadro “Nighthawks” de Edward Hopper, feita para a Capital da Cultura Guimarães 2012) dedicadas à criação maior de Hugo Pratt que tanto marcou uma geração de leitores que a descobriram nas páginas da revista “Tintin”, nos anos 70. Se o espaço limitado de uma página não permite muito grandes desenvolvimentos, há ainda assim, espaço para algumas abordagens interessantes e para reencontrar autores (mais ou menos) desaparecidos, como Arlindo Fagundes, Carlos Zíngaro, Nazaré Álvares, Renato Abreu e Ricardo Ferrand, que recupera aqui o seu Molto Portoghese, deliciosa personagem nascida noutra publicação de Geraldes Lino, o Tertúlia BDZine, para além da surpresa de Regina Pessoa, nome grande da animação nacional, que assina a magnífica capa.
Embora a maioria dos autores se procure colar, de forma mais ou menos conseguida, ao traço de Hugo Pratt, há excepções, como Andreia Rechena, Carlos Zíngaro e Paulo e Susa Monteiro, ou o caso peculiar de Alice Geirinhas, que reproduz uma série de vinhetas de Corto Maltese, utilizando a sua habitual técnica de “grattage”. Sendo naturalmente impossível, por questões de espaço, referir todas as colaborações, aqui fica a menção a três que me agradaram especialmente: a colaboração entre David Soares e Jorge Coelho, que explora os laços familiares (reais) entre Hugo Pratt e Bela Lugosi; o episódio assinado por Nuno Saraiva em que Corto se deixa de amores platónicos e passa finalmente à acção; e o improvável encontro entre o universo de Pratt e o “Space Oditty” de David Bowie, criado por Carlos Páscoa.
Ao que consta, este será o último número do Fanzine Efeméride, pois o seu editor afirma-se cansado destas (trabalhosas) andanças. Espero que não seja verdade, mas se fôr, não há dúvida que o Efeméride termina em beleza!
(“Corto Maltese no Século XXI”, Geraldes Lino (editor) e Vários Autores, 90 pags, 25 €)
Versão integral do texto publicado no Diário as Beiras de 02/02/2013
NOTA FINAL - Parafraseando Mark Twayn, parece que as notícias da morte do fanzine Efeméride após esta 5ª edição, eram manifestamente exageradas. Como o próprio editor fez questão de me informar vai mesmo haver um sexto, e último (até ver...) número do Efeméride. Um número de temática mais generalista, Os Heróis da BD no Século XXI que promete ter a colaboração de mais de uma centena de desenhadores, tendo alguns deles já entregues as suas pranchas, conforme podem ver aqui.