terça-feira, 17 de julho de 2012

O Regresso de Bouncer


Género cinematográfico americano por excelência, o Western é um bom exemplo da capacidade de Hollywood em exportar com sucesso o sonho americano. Apesar de ter como ponto de partida a realidade concreta dos EUA durante o século XIX, o Western eleva essa realidade a uma categoria arquétipica, facilmente reconhecível em qualquer parte do mundo. Mais do que a história do Oeste americano, o Western codifica a sua lenda, uma lenda que se revela ainda mais atraente para aqueles que nunca puseram os pés naqueles espaços míticos. O que explica a fortuna do género na BD europeia, com um sucesso que já deu origem a algumas das melhores séries de Western, de Blueberry a Comanche, passando por Jerry Spring, Buddy Longway, Durango ou Jonathan Cartland, já para não falar na verdadeira instituição que é o italiano Tex.
Mas o mais recente (e dos mais interessantes) western europeu é a série Bouncer de Boucq e Jodorowsky, de que a Asa acaba de editar num volume duplo, o 6º e 7º álbum da série, “apanhando” assim a edição original francesa. Incursão conjunta de Boucq e Jodorowsky pelo Oeste selvagem, “Bouncer é apresentado como um “Western Shakespeariano, com um toque de Tragédia Grega” pelo próprio Jodorowsky (que já abordou o género num filme muito pouco convencional, “El Topo”) onde não faltam as obsessões habituais na obra do argumentista do Incal, como as mutilações, a família e a religião, elementos que estão bem presentes nesta série extremamente violenta e povoada de personagens bizarras.
Apesar de Jodorowsky assinar em Bouncer alguns dos seus argumentos mais equilibrados e conseguidos, o melhor de “Bouncer” é mesmo o desenho de Boucq, verdadeiramente sumptuoso no tratamento dos cenários míticos do Monument Valley. Notável desenhador e narrador, Boucq cria aqui um fabuloso western de papel, filmado em “cinemascope”, com as vinhetas sobre o comprido a substituírem com vantagem o ecrã de 70 milímetros. Nesta última história, que a Asa recolhe num duplo álbum de mais de 120 páginas, Bouncer vê-se envolvido com duas mulheres, uma discreta professora e uma poderosa viúva que não recua perante para conseguir as terras que pretende, para acabar por concluir que as coisas raramente são o que parecem e que há mulheres verdadeiramente perigosas, até para elas próprias. Duas mulheres que se odeiam e se completam e que são personagens fulcrais de uma intriga cheia de violência e erotismo, onde não faltam figuras bizarras, como Axe-Head e a sua “adorável” prole.
Mais um belo ciclo, à altura dos pergaminhos desta série, absolutamente a não perder (“Bouncer Vol 6: A Viúva Negra e Vol. 7: Coração Dividido”, de Boucq e Jodorowsky, Asa, 128 pags)
Versão integral do texto publicado no Diário As Beiras de 13/07/2012

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