domingo, 28 de agosto de 2011

Poulet aux Prumes no cinema

Depois do sucesso de Persepolis, Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud regressam ao cinema com Poulet aux Prunes, mais uma adaptação de um livro de Satrapi, mas desta vez em imagem real. O filme, que estreia em França a 26 de Outubro, precisamente no mesmo dia do Tintin de Spielberg, conta com um elenco de peso, com nomes como Isabella Rosselinni, Mathieu Almaric, Jamel Debbouse e a nossa Maria de Medeiros. Para além da Festa do Cinema Francês, não é garantido que o filme estreie em Portugal, mas de qualquer maneira, aqui fica o trailler.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

O Sonho Americano desenha-se em Português

Como bem saberão os que o tentaram, para um autor que viva e publique em Portugal, é praticamente impossível conseguir viver exclusivamente da Banda Desenhada. A insipiência da indústria dos quadradinhos nacional, a dificuldade de encontrar jornais ou revistas onde publicar o seu trabalho (e que paguem aos colaboradores), obrigaram vários dos nossos melhores desenhadores, de E. T. Coelho a Victor Péon, passando por Carlos Roque, a imigrarem para poderem (sobre)viver da Banda Desenhada.
Actualmente, o grande sonho da maior parte dos jovens autores portugueses, que pretendem embarcar na arriscada aventura de (tentar) viver da Banda Desenhada, é conseguir fazer carreira no atraente e competitivo mercado norte-americano. E, embora tal não seja fácil, por vezes esse sonho transforma-se mesmo numa realidade, mais ou menos duradoura. Depois de uma primeira geração, composta por Eliseu Gouveia, Miguel Montenegro e Ana Freitas, que conseguiu publicar alguns trabalhos no mercado americano, em inícios da década de 2000, mas sem grande continuidade, surge agora uma nova geração de desenhadores, composta por nomes como João Lemos, Nuno Plati, Ricardo Tércio, Filipe Andrade e Jorge Coelho, com histórias publicadas regularmente em editoras como a Marvel, ou a Image.
Ao contrário dos autores das gerações anteriores, que tiveram que emigrar para conseguirem trabalho fora de Portugal, os autores referidos neste texto trabalham para o mercado americano a partir das suas casas em Portugal, beneficiando das actuais facilidades de comunicação proporcionadas pela Internet e do próprio sistema de funcionamento da indústria americana dos comics, em que o “editor” (termo que nos EUA tem um significado diferente do que lhe dado em Portugal, designando não o dono da editora – o Publisher – mas sim quem faz o editing da história, sugerindo as alterações que considera necessárias aos autores) assegura a ligação entre a Editora e as várias pessoas envolvidas no projecto, que não necessitam de estar fisicamente próximas e que, muitas vezes, nem sequer se conhecem pessoalmente.
Se alguns destes autores desenham a lápis, passam a tinta e dão cor aos trabalhos que publicam, não é assim que as coisas geralmente funcionam no mercado americano. Por via do sistema de publicação mensal e dos prazos rigorosos que isso implica em termos de produção, a indústria dos comics aposta na especialização e numa separação de tarefas em que o argumento, o desenho a lápis, a passagem a tinta (ou arte-final) e a coloração são geralmente realizados por pessoas diferentes, com o editor a servir de elo de ligação entre todas elas.
Um editor com um papel muito importante no facto de haver tantos desenhadores portugueses com trabalhos publicados na Marvel, foi C. B. Cebulski, actual vice-presidente da Marvel, argumentista e grande descobridor de talentos que depois de ter tido acesso ao port-folio de João Lemos, que este tinha entregue ao Presidente da Marvel, Joe Quesada, não hesitou em contactar Lemos, para trabalhar com ele num projecto chamado Shiki. Embora essa série, inicialmente anunciada para sair em 2007, continue a aguardar publicação, a verdade é que Cebulski ficou tão impressionado com o trabalho de Lemos, que disse numa entrevista que o desenhador português: “é um artista com um estilo nunca visto. Ele vai ser uma grande estrela dos comics e a sua arte vai ter um valor incalculável na indústria, deixando um impacto estilístico muito ao género de Mike Mignola e de Bruce Timm.”,
Tendo tomado contacto com o trabalho de outros desenhadores portugueses, via João Lemos, Cebulski usou a série Marvel Fairy Tales para os lançar. Primeiro foi Ricardo Tércio a desenhar a história de Cebulski que adapta a lenda do Capuchinho Vermelho ao Universo Marvel, seguindo-se na série Avengers Fairy Tales, os trabalhos de João Lemos, Nuno Plati e novamente Ricardo Tércio. Um conjunto de trabalhos posteriormente recolhidos no livro Marvel Fairy Tales que, nas suas 144 páginas, tem nada mais de 94 páginas feitas por desenhadores portugueses, em estilos completamente diferentes e personalizados, que vão do traço etéreo e estilizado de Lemos, ao desenho mais “cartoony” de Tércio, passando pela elegância mais europeia de Plati.
Se na versão desenhada por João Lemos da história de Peter Pan, a cor é da responsabilidade de Christina Strain, Nuno Plati na sua versão de Pinóquio, assegura também as cores e a capa, tal como Ricardo Tércio, na sua versão do Feiticeiro de Oz, embora neste último caso, a capa seja da responsabilidade da francesa Claire Wendling.
De todos estes autores, Nuno Plati é o que mais histórias tem publicado na Marvel, com uma história curta para as revista Iron Man: Titanium (tal como outro português, Filipe Andrade, que também desenha uma história curta em Iron Man Titanium e divide o desenho de X-23 com Plati) e o desenho completo dos comics Shanna, the She Devil e Marvel Girl, a que se seguiu mais uma história curta para a revista Amazing Spider-Man 657, que assinala a entrada do Homem-Aranha para o Quarteto Fantástico, na sequência da morte de Johnny Storm, o Tocha Humana.
Mas se Nuno Plati, é o português cujo nome já apareceu em mais revistas da Marvel, o português que mais páginas desenhou para a “Casa das Ideias” é, indiscutivelmente Filipe Andrade, que os leitores portugueses bem conhecem da série BRK.
Andrade, além das histórias já referidas para as revistas X-23 e Iron Man: Titanium, assinou também os desenhos de Wellcome Home e Underneath the Skin, duas aventuras de Nomad, publicadas em complemento da história principal, nos nºs 608 a 614 da revista Captain America, antes de assegurar a arte dos quatro números da mini-série Onslaught Unleashed, actualmente em publicação e que ficará na história como a primeira mini-série da Marvel desenhada e colorida por portugueses, pois além dos desenhos de Andrade, as cores são da responsabilidade de Ricardo Tércio. E já em Setembro começa a sair nos EUA a mini-série John Carter, the Princess of Mars, em que Filipe Andrade assegura o desenho e as capas alternativas da nova versão do personagem de Edgar Rice Burroughs, prestes a chegar ao cinema num filme da Disney.
Também João Lemos ficará na história, mas como o primeiro português a escrever uma história para a Marvel, pois o desenhador português foi o argumentista de Wolverine: the Dust from Above, uma história do mais popular mutante da Marvel, desenhada pela italiana Francesca Ciregia. Lemos, que voltou a Wolverine como desenhador com The Adamantium Diaries, uma história curta, escrita por Sarah Cross para a revista Wolverine 1000. E o trabalho de Lemos não se limita à Marvel, pois ele foi um dos autores convidados por David Peterson para colaborar na série Legends of the Mouse Guard, editada pela Archaia Press, assinando como autor completo (argumento, desenhos cor e legendagem) a história que funciona como epílogo à edição encadernada.
Referência ainda um novo projecto independente, ainda em fase de desenvolvimento, chamado Mia, Tales from the Lost Islands, que vai juntar Nuno Plati e João Lemos, de que esperamos voltar a ouvir falar e que, depois das colaborações entre Nuno Plati e Ricardo Tércio, confirma a tendência dos autores portugueses para trabalharem juntos.
Outro autor português que também tem publicado nos Estados Unidos, mas sem ser na Marvel, é Jorge Coelho, de quem a Image publicou Forgetless, uma mini-série escrita por Nick Spencer, em que Coelho divide os desenhos com W. Scott Forbes e Marley Zarcone. Coelho que se estreou no mercado americano como desenhador de Below the Fold, uma história curta, escrita e colorida por Eric Skillman, publicada na antologia de histórias policiais EGG, auto-editada por Skillman.
O mais recente trabalho de Coelho para a Image, The Weel Turns, uma história curta de D. K. Stockton, publicada no 2º volume de Outlaw Territory, uma antologia de histórias do Oeste, conta mais uma vez com cor de Skillman, numa parceria que se irá prolongar na novela gráfica Submerged Mary, escrita por Eric Skillman e ainda à procura de editor.
Mas estes não são os únicos portugueses a publicar BD nos EUA. Também Filipe Melo conseguiu levar o seu Dog Mendonça às páginas da revista Dark Horse Presents. Um título prestigiado, que inaugurou a actividade editorial da Dark Horse em 1986 e onde o Sin City de Frank Miller foi publicado pela primeira vez. Vinte e cinco anos depois, a editora lançou uma nova versão da revista, com 25 números previstos. Essa nova antologia, cujo primeiro número saiu em Maio nos EUA, terá participações, entre outros autores, de Frank Miller (com uma entrevista e uma preview da prequela de 300 intitulada Xerxes), Mike Mignola (Hellboy), Neal Adams, Richard Corben e Dave Gibbons (Watchmen), entre muitos outros.
É para esta revista que Filipe Melo e Juan Cavia contribuíram com uma história de 24 páginas, dividida em três capítulos de 8 páginas, que vai ser publicada nos nº 4, 5 e 6 e tem como objectivo apresentar Dog Mendonça e os restantes personagens ao público americano, preparando o terreno para a posterior publicação pela Dark Horse de As Incríveis Aventuras de Dog Mendonça e Pizzaboy nos EUA.
Uma excelente oportunidade que se deveu à intervenção decisiva de John Landis. O realizador americano, que assinou o prefácio do álbum, gostou tanto do livro que fez chegar Dog Mendonça às mãos do seu amigo Mike Richardson, o editor da Dark Horse, que se mostrou interessado na série e viu na revista Dark Horse Presents o local ideal para uma primeira divulgação das personagens junto dos leitores americanos.
Se a tudo isto acrescentarmos a biografia em BD de Angelina Jolie, editada em Janeiro de 2011 pela Editora americana Blue Water, especializada em biografias em Bd de personalidades célebres, de Obama a Oprah, que tem desenhos de Nuno Nobre, um arquitecto, designer e ilustrador português, a viver e trabalhar entre Madrid, Lisboa e Nova Iorque e que assim se estreia na BD, não há dúvidas que o sonho americano dos autores de BD se desenha cada vez mais em português.
Versão actualizada do texto publicado no nº 10 da revista Bang!, em Maio de 2011

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Capitão América no cinema

Confirmando que a Banda Desenhada marca a agenda cinematográfica deste Verão, uma semana depois de “Dylan Dog” eis que chega às salas de cinema o bastante mais aguardado “Capitão América: O Primeiro Vingador” filme que traz de volta ao grande ecrã o primeiro e um dos mais populares super-heróis da Marvel, preparando o caminho para o tão aguardado filme dos “Vingadores” (ou “Avengers” no original) dirigido por Joss Whedon, com estreia marcada para o Verão de 2012.
Primeiro super-herói a envolver-se directa e abertamente no esforço de guerra americano na 2ª Guerra Mundial, o Capitão América, criado em 1941 por Joe Simon e Jack Kirby, é o símbolo vivo do ideal americano, reflectindo o espírito da época e a vontade do povo americano de ajudar a combater Hitler e o nazismo. E era precisamente Hitler quem o Capitão América socava na mítica capa do nº 1 da revista Captain America Comics, que o filme recupera e que o cartaz em estilo "retro" de Paolo Rivera, homenageia.
Filho do seu tempo, o Capitão América surgiu porque Martin Goodman, o dono da Timely Comics, achou que, face à conjuntura da época, era altura de lançar um herói patriótico e encarregou Joe Simon, o seu editor e Jack Kirby, o seu director de arte de criarem esse herói. Como refere o próprio Kirby: “o Capitão América foi criado em função de um tempo que necessitava de figuras nobres. Ainda não tínhamos entrado na guerra, mas toda a gente pressentia que ela estava próxima. Foi por isso que nasceu o Capitão América; a América precisava de um super patriota.”
Depois de duas tentativas falhadas de levar o Capitão América ao cinema, nas décadas de 70 e 90, Joe Jhonston, que depois do subestimado “Rocketeer” volta aos filmes baseados em BDs, finalmente acerta no tom neste filme, passado quase todo durante a II Guerra Mundial. Um filme que, ao contar a origem do Capitão América, cumpre com eficácia a dupla função de criar uma versão credível do Capitão América e fazer a ponte entre os vários filmes da Marvel, como o “Thor” e o “Homem de Ferro 2”, que preparam o caminho para a estreia do filme dos Vingadores, com o personagem de Nick Fury, interpretado por Samuel L. Jackson a ter uma papel fundamental no estabelecer dessa continuidade.
Mais interessante como filme de época do que como filme de super-heróis (o número musical com o Capitão América a apelar ao público para participar no esforço de guerra, comprando Títulos do Tesouro, é dos melhores momentos do filme), “Capitão América” é um filme bastante sólido e que se vê muito bem, contando com um elenco sólido, com destaque para Chris Evans, que depois de ter sido o Tocha Humana nos filmes do Quarteto Fantástico, é um Capitão América com quem o público cria facilmente empatia, e para Hugo Weaving, perfeito como o maléfico Caveira Vermelha.
Como de costume nos filmes da Marvel, convém aguentar até ao fim da ficha técnica (o que neste caso, até nem é difícil, pois o genérico final reinventa de forma bastante bem conseguida os cartazes de propaganda americanos e soviéticos) para ter um primeiro vislumbre do filme dos “Vingadores”, num curto mas bem conseguido “teaser”, que mostra pela primeira vez juntos, todos esses super-heróis da Marvel.
(“Capitão América: O Primeiro Vingador”, de Joe Jhonston, com Chris Evans, Hugo Weaving e Tommy Lee Jones, Marvel Studios, 2011. Em exibição em Coimbra nos cinemas Zon /Lusomundo Dolce Vita e Fórum Coimbra)
Versão integral do texto publicado no Diário As Beiras de 6/08/2011

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Dylan Dog no cinema


Num verão dominado pelas adaptações ao cinema de histórias e personagens de Banda Desenhada (já tivemos “Thor” e ainda vamos ter “Capitão América”, “Lanterna Verde” e “Cowboys vs Aliens”) eis que chega aos ecrãs portugueses, “Dylan Dog: Guardião da Noite”, filme de Kevin Munroe, inspirado na série de culto criada por Tiziano Sclavi para a editora Bonelli, que em Portugal foi distribuída em versão brasileira da Editora Mythos.
Já alvo de diversas referências neste espaço, a série Dylan Dog é, nos seus melhores momentos, um clássico incontornável da BD fantástica, misturando de forma sábia o terror, o humor e a melancolia, em histórias complexas e muito bem escritas, geralmente servidas por excelentes desenhadores, como Corrado Roy, Cláudio Villa, e Angelo Stano, entre muitos outros.
Realizado por Kevin Munroe, que já tinha dirigido o 4º e último filme das Tartarugas Ninja, em 2007, o filme conta com Brandon Routh no principal papel e Sam Huntington no do seu assistente Marcus. Um elenco muito habituado aos filmes inspirados na BD, pois Routh participou no divertidíssimo “Scott Pilgrim Vs the World” e foi o Super-Homem em “Superman Returns” de Bryan Singer, em que também participou Huntington, como Jimmy Olsen. Apesar da reconhecida experiência do elenco na transposição de BDs para o cinema, esta adaptação não prima pela fidelidade à BD original, bem pelo contrário, pois a acção foi transposta de Londres para New Orleans e, por questões de direitos, o ajudante de Dylan Dog na BD, inspirado no actor Groucho Marx teve que ser substituído por Marcus, o personagem de Hutington no filme, responsável pelos momentos mais divertidos, quando é transformado num zombie e tem que aprender a adaptar-se à sua nova condição de morto-vivo.
Mas o humor da personagem de Marcus e de alguns bons diálogos não salvam um filme com um argumento cheio de buracos, uma direcção pouco criativa, efeitos especiais bastante fracos e que não consegue preservar a originalidade de “Dylan Dog”, que distinguia a série de outras abordagens ao género do terror. Ignorado de forma igualmente vigorosa pelo público e pela crítica, nos vários países onde já estreou, não deixa de causar algum espanto que “Dylan Dog” tenha chegado às salas de cinema nacionais, em vez de ir directo para DVD, o destino mais natural para um filme divertido de série B, que se esquece mal se acabou de ver.
Resta a esperança de que graças ao filme, haja mais gente a querer descobrir a série original de BD, editada em inglês pela Dark Horse e fica a certeza de que “Dellamorte Dellamore”, realizado em 1994, por Michele Soavi, continua a ser, de muito longe, a melhor e mais fiel transposição do universo de Tiziano Sclavi para o grande ecrã.
(“Dylan Dog: Guardião da Noite”, de Kevin Munroe, com Brandon Routh, Sam Huntington e Anita Briem, Platinum Studios, 2011. Em exibição em Coimbra nos cinemas Zon /Lusomundo Dolce Vita)
Versão integral do texto publicado no Diário As Beiras de 30/07/2011