segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Blake e Mortimer: A Maldição dos 30 Denários


Na passada sexta-feira, dia 20 de Novembro foi lançada, em simultâneo na França, Bélgica e Portugal, “A Maldição dos Trinta Denários”, o mais recente álbum da série “Blake e Mortimer”, a dupla de heróis “very british”, criada por Edgar P. Jacobs. Um álbum, cuja complicada produção, de mais de cinco anos e dois desenhadores, daria ela própria uma história, a que se poderia chamar “A Maldição de Blake e Mortimer”.
Após a morte de Jacobs, em 1987, a editora Dargaud, que adquiriu os direitos da série à família, decidiu fazer reviver a mítica dupla de heróis britânicos criados pelo belga Edgar P. Jacobs, numa muito bem montada operação, envolvendo duas equipas diferentes de autores, com a ingrata tarefa, não de fazer esquecer, mas de mimetizar o traço e o ambiente da fase de ouro de Jacobs, situado entre os álbuns “A Marca Amarela” e “S.O.S. Meteoros”. Mas se a ideia inicial da editora era alternar os álbuns assinados por Jean Van Hamme (o argumentista de “XIII” e “Thorgal”, que iniciou a fase “apócrifa” com “O Caso Francis Blake”), com os da dupla Yves Sente e André Juillard, os problemas que Van Hamme teve com os desenhadores com que trabalhou, desde a lentidão de Ted Benoit, que levou mais de 10 anos para desenhar dois álbuns, até à morte de René Steerne, o desenhador que substituiu Benoit, e desenhou as primeiras 29 páginas deste “A Maldição dos Trinta Denários”, leva a que se possa falar numa maldição dos desenhadores de “Blake e Mortimer”, a que só Juillard parece imune.

Maldição ou não, foi uma pena que René Sterne, desenhador conhecido pelo seu trabalho na série “Adler” tenha morrido de repente, aos 56 anos, de ataque cardíaco, deixando à sua mulher Chantal de Spiegeleer a ingrata (e emocionalmente muito dura) tarefa de terminar de desenhar a história, um trabalho que se pressente esforçado, mas cujos resultados não são brilhantes, especialmente nas cenas de acção, campo em que a desenhadora confessa não se sentir à vontade. Chantal, que juntou inúmeras personagens femininas à história, para se sentir confortável (o que se nota numa cena como a da página 33, em que há um verdadeiro desfile de mulheres de robes e camisas de dormir, impensável num álbum de Jacobs), contou ainda com a colaboração de Etienne Schréder (o nosso conhecido autor de “O Segredo de Coimbra”) nos desenhos dos cenários e de Laurence Croix na cor, neste último caso, com resultados pouco famosos, especialmente nas cenas nocturnas, que estão quase ilegíveis…
E, a sensação que dá, perante a última página do álbum, com muito menos quadrados do que o habitual, é que houve uma preocupação em terminar mais rapidamente este primeiro volume, talvez para que o livro pudesse sair, como saiu, próximo do aniversário da morte de René Sterne, que ocorreu a 15 de Novembro de 2006.

Capa alternativa da edição portuguesa, exclusiva das lojas FNAC
Quanto à história em si, Van Hamme revela a eficácia do costume, numa intriga sem grandes surpresas para quem conhece a série e que tem como modelo óbvio “O Mistério da Grande Piramide”.
O “mau da fita”, um ex-criminoso de guerra nazi com delírios de grandeza, que é uma mistura de Rastapoupolos, com o Imperador Basam Dandu, está longe de ser dos mais conseguidos da galeria de vilões da série e também não é muito claro como é que os trinta denários que Judas recebeu por ter traido Cristo, lhe vão permitir conquistar o mundo. Mas, apesar disso, a história lê-se bem e deixa-nos curiosos para saber como termina, no segundo volume, que está a ser desenhado por Aubin Frechon, um desenhador de 42 anos, vindo da animação, e que, depois de uma história de 4 páginas num álbum colectivo, se estreia na BD com este desafio de peso. Agora esperemos que Frechon não venha a ser mais um desenhador vítima da maldição de Blake e Mortimer…

Desenho a lápis de Aubin Frechon para um quadrado do 2º volume
(“Blake e Mortimer: A Maldição dos Trinta Denários” Tomo 1, de J. Van Hamme, R. Sterne e C. De Spiegeleer, Edições Asa, 56 pags, 14,50 €.)
Versão ligeiramente revista de um texto publicado originalmente no Diário As Beiras de 28/11/2009

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